Tenho reparado que começa a ser preocupantemente corriqueira, na língua portuguesa, a utilização de conjunções e locuções subordinativas concessivas — como embora, ainda que, mesmo que — com o modo verbal indicativo, e não com o conjuntivo, como o seu uso, na maior parte das vezes, exige.
Para provar o que acabo de referir, aqui transcrevo dois exemplos recentes da autoria de dois jornalistas bastante conhecidos e de quem tenho, aliás, a melhor opinião.
A. «Embora já aconteceu no passado», Ricardo Costa, Expresso da Meia-noite (SIC Notícias), edição de 11/02/2011.
B. «Embora há ali situações que têm que ver com a falta de qualidade de alguns jogadores», Rui Santos, Tempo Extra (SIC Notícias), edição de 06/02/2011.
Em A, a formulação correcta seria, por exemplo, «Embora já tenha acontecido no passado», ou «Embora já acontecesse no passado», e, em B, «Embora haja ali situações que têm que ver com a falta de qualidade de alguns jogadores».
Será que estamos aqui perante mais um daqueles «desvios padronizados ou padronizáveis», que resultam de uma tendência sentida pelos falantes, explicada, talvez (digo eu), pela influência da língua inglesa1, de que falava, neste artigo, José António Fernandes Camelo? Se assim for, permitam-me que faça minhas as palavras do referido professor: «descrever e explicar desvios padronizados ou padronizáveis (…) não implica, automática e acriticamente, que a norma-padrão os aceite e os integre.»
1 Longman Dictionary of Contemporary English: «They are generous although they are poor.» (Tradução à letra: «Eles são generosos, embora são pobres»; tradução correcta: «Eles são generosos, embora sejam pobres.»)