Na Assembleia da República, foram apreciados e aprovados os mecanismos legais da entrada em vigor do Acordo Ortográfico nos países signatários.
Como referi no texto anterior, não é o primeiro acordo nem a primeira simplificação ortográfica a que se assiste a propósito da Língua Portuguesa.
Um dos aspectos mais controversos é o da supressão das chamadas consoantes mudas ou não articuladas. O acordo consigna que, nas sequências consonânticas cc, cç, ct, pc, pç e pt, sejam suprimidas as consoantes que não se articulam, como se pode ver nos exemplos que se seguem.
— cc: colecionador, confecionar, fracionar, lecionar, transacionar;
— cç: ação, coleção, contração, correção, deteção, direção, distração, extração, fração, infração, injeção, objeção, proteção, reação, seleção;
— ct: ator, atual, adjetivo, afeto, arquitetura, coletivo, correto, detetar, direto, diretor, elétrico, espetáculo, exatamente, letivo, objetivo, objeto, projeto, refetir, teto (parte superior e interna de casa);
— pc: dececionante, excecional, rececionista;
— pç: aceção, adoção, conceção, deceção, interceção, receção
— pt: Egito, adotar, batismo, ótimo, otimismo
No caso de as referidas consoantes se articularem, elas manter-se-ão na grafia, como, por exemplo, faccioso, ficcional, friccionar; convicção, ficção, fricção, sucção; bactéria, compacto, convicto, facto, intelectual, invicta, néctar, octógono, pacto; egípcio, núpcias, opcional; corrupção, interrupção, opção; adepto, apto, eucalipto, rapto.
Esta simplificação é muito criticada, dado o valor etimológico dessas consoantes, considerado indispensável à boa compreensão das palavras. Este argumento tem alguma pertinência e validade, pois são sempre úteis os elementos que podem levar os alunos e os leitores em geral a uma melhor compreensão dos vocábulos e da história da Língua. No entanto, podemos lembrar que em 1945 foram suprimidas muitas das consoantes não articuladas, não sendo hoje essa supressão sentida como negativa. Lembro, por exemplo, o caso das palavras aflição, aflito, autor, condução, condutor, dicionário, distrito, equinócio, extinção, extinto, função, instinto, praticar, produção, produto, satisfação, vítima, vitória; assunto, cativar, cativo, descrição, excerto, presunção, prontidão, pronto, redenção, redentor, que se escreviam, antes desse acordo de 1945, aflicção, aflicto, auctor, conducção, conductor, diccionário, districto, equinóccio, extincção, extincto, funcção, instincto, practicar, producção, producto, satisfacção, víctima, victória; assumpto, captivar, captivo, descripção, excerpto, presumpção, promptidão, prompto, redempção, redemptor.
É verdade que as supressões acima referidas se deram em vocábulos cuja sílaba tónica não era aberta, mantendo-se a consoante quando precedida das vogais a, e e o, casos em que a consoante poderia exercer influência no timbre da vogal (por exemplo, acção, colecção, adopção), mas também é verdade que o argumento do valor etimológico perde alguma força ao vermos o número de palavras que tinham essas consoantes não articuladas e que usamos hoje sem disso nos apercebermos, considerando, certamente, melhor, por exemplo, a forma assunto do que "assumpto".
Mas esta questão das consoantes não articuladas não acaba aqui; há outras críticas, e pertinentes. Será o assunto do próximo texto.
artigo publicado no Diário do Alentejo de 23 de Maio de 2008, na coluna A Vez... ao Português