Não conheço regra para a prefixação de nomes próprios. O Acordo Luso-Brasileiro de 1945, em vigor, é omisso quanto ao assunto. O mesmo acontece com o de 1990, ainda não aplicado.
Por isso, seja qual for o prefixo, e até alguma autoridade clarificar o assunto, só nos podemos guiar pelas actuais regras do hífen, que, apesar de complicadas, não são exaustivas.
Como Rui Ramos sabe, emprega-se hífen, por exemplo, entre anti- e a palavra a prefixar, quando esta tem vida à parte e começa por h, i, r ou s (anti-helenista, etc.). O emprego literal da regra dar-nos-á anti-Soares (mantendo-se a vida própria do nome prefixado), mas também anticavaco, antiguterres, anticravinho, antibrasil e... "antieua".
"Antieua" parece-me inaceitável, porque as letras EUA – iniciais de Estados Unidos da América – só são identificáveis como maiúsculas. Empregue-se, pois, anti-EUA (p. ex., «os manifestantes anti-EUA»).
As outras formas – anticavaco, antiguterres, anticravinho, antibrasil – suscitam controvérsia. O principal motivo de crítica é que, com nomes menos conhecidos, a identificação se torna difícil. Mas existem precedentes: os substantivos Anticristo (*) e Anticatão (**), que chegaram ao português já formados no latim. Pode-se contrapor, contudo, que no latim se não recorria ao hífen como no português do século XX. E pode-se discordar de que se criem palavras como anticavaco, anticravinho ou antibrasil – com função adjectiva – por semelhança com exemplos clássicos como os dois citados, que têm função substantiva. Ou seja: em «os manifestantes anticravinho», «os políticos anticavaco» ou «os portugueses antibrasil», temos adjectivos; e, em Anticristo e Anticatão, temos substantivos.
Os adjectivos antiguterres, anticavaco, etc., vivem da notoriedade dos substantivos que qualificam. Os substantivos Anticatão e Anticristo, embora tivessem nascido da notoriedade dos nomes que antagonizam, não deixaram de ter, logo de início, vida própria: um era nome de livro e o outro o do "inimigo final" do cristianismo.
Em abono de antiguterres, anticavaco, etc., pode-se todavia invocar a regra do emprego do hífen. Se ela é omissa quanto aos nomes próprios, quer dizer que, nas bases do Acordo Ortográfico vigente e do Acordo em espera, nada há a opor à grafia. E, quanto às grafias de pior identificação (por exemplo, antiferreira, antigama), ninguém empregará estes adjectivos fora do contexto em que os podemos reconhecer.
Encontramos, porém, no português incerto do século XIII, a grafia: «E se non foss o Ante Christo nado...» ("Dicionário Onomástico" de José Pedro Machado). Não será exemplo bastante para justificar uma tradição portuguesa quanto à prefixação de nomes próprios. Mas, se recorrermos a outra língua novilatina, por exemplo a francesa, depara-se-nos "Antechrist" (ou "Antéchrist"), única excepção numa série de substantivos bibliófilos compostos com nomes próprios: "Anti-Caton", "Anti-Machiavel" (***), "Anti-Lucrèce" (****).
O uso determinará a forma que há-de prevalecer.