Réplica do autor à divergência do consulente João de Brito, O predicativo do sujeito, os modificadores e o «se.
Li muito atentamente os seus reparos, e eu vou reparar bem neles, de início, a partir do nº.3 e, mesmo no final, não descurarei o nº.1.
E reparei, antes de mais, na sua afirmação inicial:
«Tal como se conhece, o predicativo do sujeito integra sempre o predicado».
Não deveria ter escrito «como se conhece», mas «como eu o conheço» — o que faz uma diferença muito grande.
1. Ao falarmos em predicativos falamos de expressões atributivas que predicam algo. Se o seu referente for o sujeito, teremos predicativos do sujeito. Em linguagem espontânea, descomprometida, até poderíamos dizer que o predicativo do sujeito é concorrente do predicado, pois tanto um como o outro prestam informações sobre o sujeito. O predicado é informação primária, essencial; o predicativo é predicação secundária, opcional.
Afirma o Colega que o predicado integra sempre o predicativo. Para quê? Duas funções para a mesma expressão atributiva? Ao reparar com alguma demora nessa sua afirmação, parece-me ter concluído que o Colega está a partir do princípio de que o predicativo do sujeito é o predicado dos verbos copulativos; logo, predicado e predicativo seriam duas funções dum mesmo grupo sintático. E, por isso, a sua afirmação de que o predicativo «nunca é virgulado». Mas é, pode ser.
2. Eu bem sei que há gramáticas que dizem isso. Mas… não têm razão.
3. Analisemos uma frase: Joana, mesmo coxa, foi às aulas.
Suj.: Joana; pred.: foi às aulas; às aulas: complemento preposicionado de regência verbal; mesmo coxa: inciso predicativo do sujeito ou, simplesmente, predicativo do sujeito.
O sintagma adjetival mesmo coxa não é, nem pode ser outra coisa que não seja predicativo do sujeito. Aquele sintagma só se relaciona com o sujeito, pode ocupar várias posições na frase, pode nela entrar e sair sem afetar a gramaticalidade: é opcional. Predicativo do sujeito é isso.
Fala o Colega, nestes casos, em modificadores de frase. Sugiro-lhe que pense um bocadinho, dois segundos é mais que suficiente: em que é que aquele sintagma interfere com a frase? Modifica-a? Modificador… a que propósito? Aquele inciso é uma expressão atributiva do sujeito; presta informação, mas nada modifica.
4. E passamos já para o se.São muito diferentes as funções sintáticas dos se das frases 1, 2 e 3:
(1) - Joana declara-se ao Pedro – se: pron. pessoal reflexo, compl. direto.
(2) - Joana declara-se rainha da noite – se: pron. pessoal reflexo, sujeito duma oração reduzida que, na frase, é compl. direto.
(3) Errou-se (então, ao afirmar que…)…
Este último se nada tem a ver com pronomes. Se o tivesse, o se seria substituível pelo seu referente e desempenharia, obrigatoriamente, uma função sintática.
É certo que o verbo errar supõe sempre a existência dum sujeito, mas a língua possibilita que o enunciador opte por uma construção em que esse sujeito não seja revelado (um sujeito tácito). Tal construção, a construção impessoal reflexa, só é possível com verbos de referente pessoal.
A tentativa de algumas gramáticas descobrirem um sujeito que o enunciador, por ignorância ou por estratégia, ocultou, põe em confronto as capacidades do enunciador e da sintaxe: o primeiro, a ocultar e a sintaxe, a querer revelar. Mas a sintaxe não joga o jogo de gato e do rato com os autores das frases. Não pode, nem é objetivo da sintaxe, descobrir aquilo que o enunciador nela quis esconder, e escondeu mesmo.
O se das construções impessoais não é sujeito. Se o fosse, admitiria expressões atributivas (predicativos do sujeito) — o que não é possível.
Parece-me ter sido claro. Não me reconheço nas suas referências a arrogância e a paternalismos (n.1).
Cf. Função sintática de «se»: sujeito ou complemento agente da passiva? + Análise de «Veja(m)-se as seguintes...» + Ainda «Veja(m)-se as seguintes...» + O predicativo do sujeito, os modificadores e o «se».