DÚVIDAS

«Violência de género» e «igualdade de género»

As expressões “violência de género” e “igualdade de género(s)” são cada vez mais frequentes e aparentemente já foram consagradas por sociólogos, psicólogos, jornalistas, etc. Parece-me uma importação abusiva do inglês “gender”. “Género” em português é uma classificação gramatical e não significa “sexo”. Por outro lado, argumenta-se que a expressão de origem inglesa expressa melhor uma distinção alegadamente necessária: enquanto “sexo” é uma categoria biológica, “género” é uma categoria cultural.
Argumenta-se também que os substitutos não são melhores: “igualdade de género” será melhor que “igualdade de sexos” (um erro biológico) ou “igualdade entre homens e mulheres” (expressão demasiado longa); “violência de género” será mais acertado que “violência doméstica” (nem sempre é “doméstica”), “violência sobre as mulheres” (também a há sobre os homens) ou “violência sexual” (manifestamente inadequada). De qualquer forma, a Real Academia Espanhola já se manifestou contra o uso de tal expressão em espanhol. Que dizer disto na nossa língua?
Obrigado pela atenção.

Resposta

A palavra género tem vários significados, sendo o mais importante aquele que se refere à sistemática. Daí falar-se em género humano.
Em termos biológicos, o género humano é composto por seres do sexo masculino e do sexo feminino. Dentro deste domínio, não é conveniente criar confusões quando as situações já estão definidas.
Em relação aos estudos linguísticos, a palavra género tem uma utilização diferente.
De facto, as gramáticas da língua portuguesa distinguem o género masculino e o género feminino, mas as gramáticas da língua inglesa distinguem género masculino, género feminino, género comum (“friend” e “cousin”) e género neutro.
Perante estes exemplos, qual será a forma a usar pelos sociólogos, psicólogos, etc.?
Parece-nos que o caminho da biologia é o melhor porque está de acordo com a natureza humana.
A classificação gramatical está de acordo com as características meramente linguísticas, visto que, na língua alemã, “das Fräulein” é do género neutro e refere-se a uma menina ou jovem casadoira. Nós dizemos as crianças e podemos estar a referir-nos a um grupo de meninos.
Nem sempre o sexo dos indivíduos corresponde ao género gramatical.
Por isso, a classificação gramatical não corresponde estritamente à classificação biológica.

Análise das questões propostas
Há duas questões que pomos desde já: por que motivo “género” é uma categoria cultural? Os homens constituem uma categoria cultural diferente das mulheres?
Julgo que é oportuno lançarmos um alerta. Não devemos sintetizar excessivamente porque corremos o risco de não sermos claros.
Concordamos que “igualdade de sexos” é um erro biológico. Em contrapartida, não nos parece que “igualdade entre homens e mulheres” seja uma expressão demasiadamente longa.
Desconhecemos o uso da expressão “violência de género”.
“Violência doméstica” deve abranger só aquela que ocorre dentro de casa ou entre familiares que coabitam. Generalizando, também poderemos falar de “violência familiar”.
“Violência sexual” será apenas aquela que directa ou indirectamente se refere à actividade sexual, porque existe, de facto, violência de ordem sexual, mas esta pode ocorrer entre familiares, entre não familiares ou entre estranhos.
“Violência sobre as mulheres” e “violência sobre os homens” são expressões curtas e perfeitamente compreensíveis.
Sobre a origem da palavra sexo, aconselhamos a leitura de «O Banquete», de Platão.

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