A sequência «quer esteja no quarto, quer esteja na rua» é constituída por orações coordenadas disjuntivas – mas definir a relação que permite a oração «de casa não saio» já se torna mais difícil.
A análise complica-se depois, ou melhor, parece fugir aos padrões mais frequentes e conhecidos de articulação entre orações. Com efeito, a relação entre estas coordenadas e a restante frase parece enquadrar-se no que certos autores denominam como «orações justapostas», como acontece com Evanildo Bechara (Moderna Gramática Portuguesa, Rio de Janeiro, Ediora Lucerna, 2002, pág. 507), que fala em orações justapostas de valor contextual adverbial. Parece-me que uma das leituras atribuíveis à frase em questão é próxima da seguinte análise, propposta por Bechara (idem):
«A justaposição pode, no nível do texto, apresentar as seguintes interpretações:
a) concessivas: tendo o verbo no subjuntivo anteposto ao sujeito ou caracterizadas por expressões do tipo digam o que disserem, custe o que custar, dê onde der, seja o que for, aconteça o que acontecer, venha donde vier, seja como for, etc.:
Tivesse ele dito a verdade, ainda assim não lhe perdoaríamos.
Sairemos, aconteça o que acontecer. [...]»
Tendo em conta esta perspetiva, eu parafrasearia a frase em discussão deste modo:
1. Ainda que ele/ela/você esteja na sala ou no quarto, eu não saio de casa (pressupondo como contexto uma situação de conflito doméstico, em que se disputa um espaço que era comum, e a presença de outra pessoa não é considerada razão para o abandono desse espaço por parte do sujeito do enunciado).
Mas outra leitura é possível:
2. Estou no quarto ou na sala, mas de casa é que eu não saio (pressupondo o compromisso de alguém a não sair da sua habitação e diposto a circular apenas pelas divisões disponíveis).
Em suma, a relação entre as coordenadas e a oração «não saio de casa» não deixa explícito, mediante a ocorrência de uma conjunção, de que tipo são as relações semântica e estrutural entre uma sequência oracional e a outra – muito dependerá do contexto em que tal frase ocorrer. Não se trata, portanto, de um caso adequado para explorar no contexto escolar, pelo menos até os alunos chegarem ao ensino secundário.