DÚVIDAS

Pronomes rectos/retos após preposição

A brasileira Maria da Conceição Barbosa afirmou que não se pode usar pronome reto após preposição, quando se deve, então, empregar o pronome oblíquo. E, diante dessa "regra", ela se indaga se o certo seria dizer "para mim fazer" ou "para eu fazer". A resposta do Ciberdúvidas de 19 de novembro de 2000 iniciou-se com a afirmação de J.N.H. de que desconhecia qualquer regra que afirmasse que o pronome reto não poderia ser precedido de preposição. Bem, talvez essa "regra" não tenha sido claramente enunciada, mas a própria natureza dos pronomes acaba fazendo com que ela exista. Os pronomes retos são meramente sujeitos da oração, e portanto não podem ser usados precedidos de preposição, pois esse seria o caso do objeto indireto. Após preposições, há formas oblíquas tônicas a serem usadas. É por isso que dizemos: "Este presente é para mim", e nunca "Este presente é para eu". Ou então: "Ele me viu", e é gramaticalmente incorreto dizer "Ele viu eu", pois "eu" só pode ser sujeito. O problema é que a regra de Maria da Conceição foi mal formulada. Na verdade, usam-se após preposições, como já mencionado, as formas tônicas correspondentes, também oblíquas. O exemplo que ela nos dá, entretanto, não está relacionado a essa "regra". Aqui no Brasil é muito comum ouvir dizer que "para mim fazer" é errado, com o que estou de acordo; talvez por isso Maria tenha feito essa pergunta. Só que nesse caso a preposição "para" não antecede simplesmente um pronome, uma forma tônica (que deveria ser "mim", se finalizasse a oração), mas sim uma oração subordinada. E esse "eu" do "para eu fazer" é o sujeito dessa oração subordinada (no caso, reduzida). Se desenvolvêssemos tal oração, teríamos "para que eu faça", ou "para que eu fizesse", dependendo do tempo empregado. Ou seja, usaríamos "eu" na oração desenvolvida, porque esse "eu" é o sujeito. Por isso, os exemplos que J.N.H. utilizou em a) estão, obviamente, corretos, pois todos são orações reduzidas. Na letra c), ao dizer "Isto foi feito por nós/vós/eles", ele não está, na verdade, utilizando o caso reto, mas a forma tônica que é usada após preposição (a saber: mim, ti, ele, ela, nós, vós, eles, elas), o que invalida, de certa forma, esse exemplo. O que me intriga, entretanto, são os exemplos b) e d) propostos por J.N.H. Em b) ele se vale da oração "Entre tu/nós/vós e eles há grande amizade". Quanto ao "nós/vós/eles" não há dúvidas; sabemos se tratar da forma tônica que é utilizada após preposição. Mas quanto ao "tu", surge um problema: não deveria ser "ti"? Infelizmente não disponho de nenhuma gramática no momento à qual possa recorrer, e não me lembro do que li sobre o assunto. O que sei é que aqui no Brasil é muito criticado o uso de "entre eu e você", generalizado e que não soa errado nem mesmo aos estudiosos da língua, afirmando-se que o correto seria "entre mim e você", justamente pelos fatores acima explicados. É isso mesmo? Já em d) ("Olha que até eu faço isso") acredito termos um "falso exemplo". A preposição "até" pode ser aí omitida, embora a oração perca grande parte de sua significação. Além disso, a referida preposição não tem aí seu significado primeiro, que denota espaço, o que, entretanto, não explica muita coisa. O que eu posso deduzir, na verdade, está relacionado justamente ao que foi dito acima: em d) estão presentes duas orações, e o "eu" é o sujeito da segunda, podendo, assim, aparecer apenas no caso nominativo (ou reto). De qualquer forma, ainda preciso refletir sobre o problema: ou será que o caráter das preposições "entre" e "até" são diferentes? Sou estudante de Letras da Universidade de São Paulo e gostaria de ouvir (ou ler) o que vocês têm a dizer sobre o assunto, para que possamos refletir um pouco juntos. Como não tive muito tempo de pensar sobre a questão, não sei se meus exemplos e explicações são realmente válidas. Vocês poderiam me ajudar? Obrigada pela atenção.

PS: Para a Maria da Conceição: em breves palavras, eu diria que o certo é dizer "para eu fazer" porque o sujeito da oração é o pronome "eu" (= "para que eu faça/fizesse"), e que a regra que ela formulou, embora falha (afinal, são usadas formas oblíquas específicas - e tônicas - após preposições) não se aplica nesse caso.

Resposta

Agradeço tudo que diz acerca da minha resposta a Maria da Conceição. Fez-me observar e pensar.

Tem toda a razão no comentário feito à alínea c). De facto, no caso apresentado, não temos os pronomes rectos. Não sei porque tal me aconteceu, e peço desculpa a quem me leu (até rima!). Só há uma explicação: distraí-me. As formas ele, nós, vós, eles são formas de sujeito, mas também são formas de complemento. Distraí-me e vi-as como formas de sujeito. São coisas que acontecem, mas não deviam acontecer. Peço desculpa.

O pronome pessoal recto pode ser regido de preposição, quando esta inicia a oração. É o caso da alínea a) na resposta a Maria da Conceição. Outros exemplos:

a) Fico aqui até tu resolveres o assunto.
b) Em tu chegando, ir-me-ei embora.
c) Ficaram tristes por eu não os ajudar.
d) Sem eu te emprestar dinheiro, não poderás comprar o que desejas.
e) Fiquei aborrecido de tu ficares / de ele ficar / de nós ficarmos / de vós ficardes / de vocês ficarem / de eles ficarem sem jantar.

Aqui temos seis casos, contando com o da preposição para, em que vemos o pronome pessoal recto antecedido de preposição.

A alínea a) mostra-nos claramente que há, pelo menos, seis preposições que podem ser seguidas de pronome pessoal recto. Esta construção exige o verbo no infinitivo pessoal ou no gerúndio: alínea b).

Não me recordo de ter visto tratado este assunto. Por isso, se alguma dúvida permanecer, agradeço que me diga.

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