Segundo o Sistema Internacional de Unidades (SI), a regra brasileira é que está correcta. As unidades pluralizam só a partir de 2 inclusive.
Sublinho, porém, que se pode argumentar que as normas não passam de convenções.
Tradicionalmente, em Portugal, a gramática frequentemente tem considerado singular só a unidade. Assim, como 1,8 é mais que 1, não escandaliza escrever-se «1,8 milhões» e até desagrada ouvir «um vírgula oito milhão».
No caso de fracções da unidade, já se aceita «0,7 do euro».
Insisto que se deve respeitar o SI. Seguir as normas tem vantagens óbvias, em particular quando se trata de recomendações internacionais, como é o caso das normas do SI.
A propósito, estamos justamente agora em Portugal numa crise de perplexidade ante novas normas. Refiro-me ao novo Acordo Ortográfico.
Por exemplo, acto > ato (como de atar), corrector > corretor (como de intermediário), espectador > espetador (como de espetar), etc.; estão a confundir os falantes portugueses. Ora, lembremos que perplexidades semelhantes já existiram no passado, quando a grafia mudou (muito em 1911), e que as novas grafias acabaram sempre por se fixar nos hábitos linguísticos.
As normas são úteis para que haja unicidade nos conceitos. São mesmo uma sujeição quando se referem à segurança de pessoas ou de bens.
Parafraseando uma frase bíblica, todavia, as normas existem para as pessoas, e não estas para as normas. Não são dogmas: em princípio, aceita-se que sejam alteradas com a evolução dos conhecimentos.
No caso em apreço dos plurais, talvez um dia o SI decida pluralizar logo acima da unidade, de acordo com o senso comum. Por mim, não condeno quem escreve «1,8 milhões».
No caso que lembrei das normas ortográficas, pessoalmente critico o fundamentalismo da sujeição ao critério fonético do Acordo de 1990. Quem elabora os vocabulários para o novo AO já concluiu que não podia uniformizar graficamente os significantes óptica e ótica, não obstante a pronúncia da palavra referente à visão ser a mesma da palavra referente à audição. Ora, no meu Vocabulário Fundamental para o Novo AO vou propor como variantes corrector, espectador, pára, etc. Vou mesmo mais longe: ninguém me pode proibir de escrever concepção, não obstante o p ser mudo em Portugal, visto a palavra ser já legal no texto do Acordo; ninguém me poderá proibir de adoptar, em Portugal, a consoante muda incluída na sequência, nas múltiplas palavras dos casos em que o Brasil a pronuncia, como confeccionar, defectivo, imperceptível, preceptor, receptor, etc., etc., quando estas palavras figurarem num vocabulário comum (e não será uma violência serem agora proibidas em Portugal, se vão ser autorizadas depois?).
Repito: as normas não são dogmas. Devemos segui-las, mas sempre procurando aperfeiçoá-las.