DÚVIDAS

«Os “vês” pelos “bês”» (Portugal)

O concerto de Rui Veloso no Coliseu do Porto foi anunciado assim – "os vês pelos bês".
Estará isto bem? Ou seria precisamente o contrário – «os bês pelos vês»?
Porque, autonomizada como foi, a frase não poderá ser lida como se acaso fosse precedida do verbo “trocar” – «trocar os vês pelos bês». E então deveria ser a de «os bês pelos vês» – usar os “bês” pelos “vês”.

Resposta

Um dos aspectos caracterizadores dos dialectos portugueses setentrionais (variedades do português europeu que vão desde a fronteira do Norte de Portugal até Aveiro-Coimbra-Beira Interior) é a substituição de [v] por [b] (ou [β]). Assim:

vai pronuncia-se
[β]ai e não [v]ai;

fava pronuncia-se
fa[β]a e não fa[v]a.

O fenómeno essencial não corresponde a uma troca, mas a uma neutralização da oposição fonológica entre as consoantes /b/ e /v/. O que pode haver – e muitas vezes há – é uma hipercorrecção por pressão da língua-padrão. Temos, então, realizações como:

[v]om e não [β]om

Desconheço o que terá levado à selecção desse título para o espectáculo de Rui Veloso. Sei, claro, que este tema está presente numa canção dele. O que digo é que não sei se este específico título se deve ao desconhecimento ou à busca de algum efeito de sentido.

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