Ũa (uma) é a forma arcaica do artigo indefinido feminino uma. O til indica a existência de uma vogal nasal seguida de outra vogal. Esta forma arcaica do artigo deriva do numeral cardinal latino ūnus, a, um. Na evolução do latim para o português, o numeral ūnu sofre síncope (ou seja, desaparecimento) da vogal dental nasal [n], resultando na nasalização da vogal que a precedia e no dissílabo ũu, também grafado hũu (José Pedro Machado, Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa); posteriormente verificou-se a supressão da vogal não nasal de modo a cessar o hiato (encontro entre duas vogais), resultando assim ũ, escrito hoje um. Em ũa, verificou-se igualmente a síncope da consoante dental nasal [n], resultando a forma que a consulente refere.
Quanto à sua evolução de ũa até uma, explica Silveira Bueno (Formação Histórica da Língua Portuguesa, 1958) que a inclusão da consoante bilabial nasal m se pode ter devido a analogia gráfica com a forma do artigo indefinido masculino um. Já Leite de Vasconcelos (Lições de Filologia Portuguesa, Lisboa, Oficinas Gráficas da Biblioteca Nacional, 1926, p. 295) defende que: «O numeral um provém da forma antiga ũu, do latim ūnu-. O numeral uma provém da forma antiga ũa, pela intercalação da consoante labial nasal m depois de uma vogal também labial e nasal (à semelhança do que aconteceu em vinho, de vĩo, onde uma consoante palatal-nasal se intercalou depois de uma vogal da mesma natureza. A vogal nasal do feminino manteve-se até tarde na língua literária (na popular ainda hoje se conserva), obrigada pela nasalidade do masculino, como em bõa, onde õ se manteve muito tempo por causa da de bõ (bom)».
Existem várias obras, nem sempre de fácil acesso, a que a consulente poderá recorrer de modo a obter mais informação acerca de vocábulos que, porventura, encontrará no decorrer da sua leitura, entre os quais salientamos: o Diccionario da Antiga Linguágem Portugueza, de Henrique Brunswick; e os glossários disponíveis em Textos Arcaicos de J. Leite Vasconcelos e no Compêndio de Gramática Histórica Portuguesa de José Joaquim Nunes. Note-se, contudo, que o ciberespaço é pródigo em recursos que poderão auxiliar a leitura de documentos antigos. A título de exemplo, nesta página é disponibilizado um sucinto, mas não menos interessante, esboço diacrónico da evolução do latim vulgar para o português.
Observe-se, por último, que na Gramática do Português (Fundação Calouste Gulbenkian, 2013, p. 129), se considera que o arcaísmo ũa tem ainda uso no português contemporâneo, «sobretudo nos dialetos setentrionais e também nos Açores e na Madeira».