Em primeiro lugar, a expressão ocorre com um outro verbo, talvez o leitor tenha simplesmente compreendido mal o termo utilizado, uma vez que se trata de um termo classificado no Dicionário Aurélio como "popular brasileiro". Ou, por ser uma entrevista em versão escrita, pode se tratar de um deslize na transcrição. A versão em uso da expressão é a seguinte:
"(Não) cutucar a onça com vara curta".
Cutucar seria tocar de leve com o dedo, o cotovelo ou com um objeto. Também pode ser usado em sentido metafórico, quando quer dizer o mesmo que sacudir, também usado em sentido metafórico, significando dar uma advertência ou chamar à realidade. Há inclusive uma variante ortográfica que é "catucar", com o mesmo sentido. Dar uma cutucada ou uma sacudida em alguém, o mesmo que trazê-lo à realidade, fazê-lo ver algo para o qual parece momentaneamente cego.
Uma onça é um felino de grande porte, no Brasil, corresponderia ao jaguar ou à pantera. Representa perigo , em geral, e é usado também em sentido metafórico para designar alguém temível. Temos, inclusive a expressão: "ficar/virar uma onça" como ficar possesso, ou furioso.
Há, também, uma expressão antiga "o amigo da onça" que foi utilizada como título de uma série de História em Quadrinhos ou Banda Desenhada. "O Amigo da Onça" é um popular personagem de humor de nossa história. De 1943 a 1961 apareceu semanalmente na revista "Cruzeiro". E, na língua em uso, a expressão queria dizer aquele que não é amigo de ninguém. O personagem de HQ tinha um olhar ácido sobre a vida e a sociedade satirizando costumes e acontecimentos.. Hoje, acho pouco provável que menores de 30 anos utilizem essa expressão.
Finalmente, "cutucar onça com vara curta" é o mesmo que meter-se onde não se deve e arriscar-se por vontade própria, provocar uma reação de alguém mais poderoso. Pode ser substituída por "meter-se num vespeiro" ou, mais brasileiramente "meter a mão em cumbuca" mas essa última, então, merece quase um tratado de folclore.
Não sei ao que o nosso ex-presidente se referia, mas "a onça", no caso, poderia bem ser uma potência como os EUA, cujos dirigentes não devem ser contrariados abertamente ou a inflação, eterno fantasma de todos os brasileiros, cujos indícios não devem ser menosprezados sob o risco de graves conseqüências sociais. Além do que, ao se tomarem medidas econômicas devem sempre ser medidos os riscos de um possível aumento da inflação e usar de comedimento nas reformas de maneira a não entrar na zona de perigo.
Quanto à origem da expressão, há pouca informação concreta mas eu arriscaria uma hipótese sobre os hábitos dos habitantes do interior do Brasil, sobretudo no Norte e Centro-Oeste, onde é mais comum encontrar esse felino que, em geral, não ataca seres humanos gratuitamente, exceto quando provocada. Dessa forma, caso se pretenda cutucar uma onça, melhor fazê-lo com uma vara bem longa, de forma a poder esquivar-se, caso ela se aborreça e resolva atacar, do contrário é risco na certa.
Espero ter ajudado a trazer contexto à expressão que, de resto, tem uso alargado na variedade brasileira.
NB: O Mário Prata fez uma "brincadeira" publicada sob o título de "Mas será o Benedito?", Ed. Globo, Rio de Janeiro, 1996, onde dá explicações a vários provérbios, expressões e ditos populares. É preciso, porém, atentar para a "explicação mais que necessária" dada por ele no início do livro, onde esclarece que o conteúdo do livro é uma compilação das versões de explicação inventadas por ele, uma vez que, ao pesquisar, não obteve consenso sobre nenhuma delas entre os autores pesquisados. E o autor realmente caprichou na brincadeira, basta localizar sua explicação para a expressão acima que, por sinal, eu ignorei.