DÚVIDAS

Ferramentas na Língua. Portugal-Brasil

Escrevo esta carta para lhes pedir informações sobre referências de consulta acerca desta nossa bela língua, que em tempos de atentados linguísticos vigentes e enfileirados no porvir, tem de ser defendida do niilismo linguístico e peçonhento conformismo, com unhas, garras, dentes, e excelentes referências encadernadas com o legado no seu ventre.

Sei que enunciar exaustivamente e qualitativamente um sortido de dicionários e tratados da língua portuguesa, pode ser uma tarefa morosa e provavelmente desenquadrada em relação a uma pessoa desconhecida, que, fazendo assim sumariamente um tal pedido, aparentemente não faz ideia do trabalho envolvido na dita tarefa.

Calculo bem no entanto o peso deste pedido, e se os importuno com estas questões é porque todas as tentativas de recolha de informação neste âmbito se me provaram totalmente infrutíferas. Detenho a maior consideração pelo projecto Ciberdúvidas, e foi daí que surgiu a possibilidade de os contactar. Peço que não levem a mal esta minha liberdade intromissora, mas espero que compreendam a minha falta de opções.

Passando a explicar um pouco melhor, e da forma mais sucinta possível, gostaria de saber quais são os dicionários de referência da língua portuguesa.

E por língua portuguesa entenda-se português europeu... a minha jovem intransigência não dá sequer lugar à consideração das monstruosidades que se propagam nas terras brasileiras. Prefiro esquecer esse tipo de barbaridades linguísticas institucionalizadas, senão vejo-me francamente encolerizado de forma talvez demasiado célere. Pouco me interessam portanto referências a dicionários prolíficos em palavras inventadas ou mutadas do outro lado do Atlântico.

Para pontuar a minha posição acerca destas diferenças, faço ainda o reparo pessoal da minha total estupefacção face a algumas posições mais liberais de um dos membros do corpo do Ciberdúvidas, o Sr. D´ Silvas Filho.

Mas voltando portanto ao cerne, a quantidade final de volumes pouco me importa... um investimento para a vida não deve ter limites de formulação. Assim, tenho procurado no Ciberdúvidas referências a dicionários que sejam utilizados para elucidar as várias questões que se põe diariamente. Por um agregado de algumas referências cruzadas, cheguei à seguinte curta lista:

– «Dicionário de José Pedro Machado»
– «Elucidário das Palavras, Termos e Frases...» (1798) de Joaquim de Santa Rosa de Viterbo / «Elucidário Viterbo»
– «Grande Dicionário de Dificuldades e Subtilezas do Idioma Português» de Vasco Botelho do Amaral

Em relação a esta pequena lista, além de duvidar que seja devidamente completa para o filólogo amador, também me faltam os dados em relação às devidas editoras, à diferença de conteúdos/detalhe dos mesmos e meios para os arranjar, pois não me parece que possa encontrar estas e outras referências de peso do género nas livrarias comuns.

Mas só agora, após a introdução prévia, passarei a expor o busílis do meu pedido e subsequente dificuldade e extensão... é que além de procurar excelentes dicionários gerais não especializados da língua portuguesa, gostaria também de saber do paradeiro de outros mais específicos: dicionários etimológicos no topo desta segunda sede, seguidos de dicionários de sinónimos, rimas, antónimos, vocabulários ortográficos (detenho um de 1912 por A. Xavier Rodrigues, cuja qualidade desconheço), e outros demais que possam guarnecer uma pessoa do mais completo legado linguístico português possível.

Provavelmente vão achar esta demanda megalómana, mas sinto uma degeneração da língua a desenhar-se de forma quase "Orwelliana"... o dicionário de consumo geral parece-me que anda a ficar cada vez mais pequeno de ano para ano, quando a meu ver, os dicionários deveriam ir crescendo mais e mais conforme as nossas raízes léxicas se desnudam pela pesquisa filológica. Esta perspectiva de displicência em relação à nossa cultura assusta-me: desejo portanto deter os meios para que nem eu nem os que me estão próximos sejamos afectados por este fenómeno mórbido... ou que se houver uma afecção, que haja também o antídoto.

Não sei bem como lhes começar a agradecer, nem que seja o tempo e disponibilidade para ter lido este meu pedido, quanto mais se de facto o levar a cabo. Não haja pressa alguma, este é um pedido para a vida... simplesmente lhes peço que conforme o seu declínio ou aceitação, assim me avisem por ‘e-mail’ para eu poder esperar ou esquecer em paz.

Resposta

Ferramentas na língua:

Peço-lhe que consulte a última página do Prontuário da Texto Editora, 3.ª versão. Está registada uma razoável bibliografia, que o pode ajudar. E acrescento: «Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa», da Academia Brasileira de Letras, um notável trabalho, de 1 998, com cerca de 350 000 verbetes; e o recente «Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea», da Academia das Ciências de Lisboa, de 2 001, que indica registar cerca de 70 000 entradas. Quanto à etimologia, este último e, por exemplo, também, o Universal da Texto Editora podem ser-lhe úteis.

Portugal-Brasil:

Uma pessoa tolerante deve aceitar sempre opiniões divergentes. O que tem é o direito de se insurgir contra os exageros. Ora a sua frase «monstruosidades que se propagam nas terras brasileiras» é manifestamente um exagero, no sentido que lhe dá. Não é por serem brasileiras que são monstruosidades: também as há por cá… Fica-lhe bem esse seu desejo de defender a nossa língua. Eu igualmente a procuro defender; mas o meu português é universal, dos cinco continentes: uma língua de mais de 170 milhões de falantes; e penso que assim consigo defendê-la melhor da submersão, no caudal de outras línguas hoje planetárias. Com a idade, aprendi que a união traz sinergias que não se conseguem com esforços isolados. Nesta Aldeia Global em que começamos a viver, todos os esforços de conjunto para a defesa da língua são necessários.
Não posso deixar de aceitar a sua estupefacção, mas, já agora, receba também a minha, por ser tão isolacionista, tão fechado no português europeu.

Observo, finalmente, que, quando tiver de fazer, por exemplo, um relatório, irá certamente usar um estilo mais simples…

Repito que não me sinto ofendido com a sua apreciação sobre a minha maneira de pensar. Os elogios que faz ao nosso trabalho em Ciberdúvidas compensam bem. Muito obrigado. E o amor que sente pela língua merece todo o meu interesse. Escreva sempre.

Ao seu dispor,

ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de LisboaISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa