DÚVIDAS

Estrutura e formação de palavras

Estou escrevendo uma série de livros de 5.ª a 8.ª série e pretendo usar testes de vestibulares. No assunto Estrutura e Formação de Palavras, tenho dúvidas quanto a dois gabaritos de vestibulares da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina).

Ei-las:

Em UFSC - 98, o gabarito oficial considerou correta a proposição 01, concorda?

01) A flexão de gênero em ateu > atéia e em judeu > judia provoca uma alteração nos radicais, já em peru > perua e doutor > doutora, os radicais mantêm-se os mesmos.

Em UFSC - 93, o gabarito oficial considerou correta a proposição 02, concorda?

02. A palavra "rejuvenescer" apresenta, simultaneamente, o prefixo "re-" e o sufixo "-escer".

Em 01, considerar que a adição da desinência de gênero feminino alterou o radical de ateu para atéi e de judeu para judi. Não é lógico, entretanto, em vista de palavras como ateísmo, ateísta, ateístico, ateização e ateizar considerar ateu como radical. Levando-se em conta sua família etimológica deveria este ser atei-.

Ou ainda, considerar judeu como radical quando se examina seus cognatos judiar, judiação, judiaria. O radical deve ser judi-. Concorda?

Em 02, como o Aurélio registra juvenescer, não se pode falar que o acréscimo de re- e -escer é simultânea. Temos aqui uma prefixação e sufixação.

Concorda?

Resposta

O assunto talvez não seja tão simples como parece. Vejamos a primeira frase:

01) A flexão de género em ateu > ateia/atéia e em judeu > judia provoca uma alteração nos radicais.

Segundo o «Dicionário Gramatical da Língua Portuguesa» de Celso Pedro Luft, brasileiro, o radical é a «parte da palavra que resta quando se eliminam as desinências e a vogal temática», quando esta existe, claro.

Depois apresenta os seguintes exemplos: «civiliz- (em civilizar, civilizamos, civilizaremos, civilizei, etc.)».

É evidente que em civil, civilidade, civilismo, civilista, o radical é outro: civil-.

Segundo esta doutrina, temos o radical ate-, e não atei-, porque este i pertence aos sufixos: ate-ismo, ate-ista, ate-ístico, ate-izar; em ateização, temos o radical ate- + dois sufixos: -iza(r) e -ção: ate-iza-ção.

Em ate-u, temos o mesmo radical, pelo menos parece.

Em ateia, temos o radical ate- e a desinência do feminino -a. O -i- é apenas uma vogal de ligação. Sem a vogal de ligação, teríamos o feminino atea. Para evitar o hiato ea, deu-se a epêntese do i.

Como vemos, o feminino ateia não provocou alteração do radical – pelo menos é o que parece.

Vejamos agora o caso de judeu/judia.

Se fizermos uma lista de palavras da família de judeu, verificamos que a raiz é jud, mas que há vários radicais, conforme vemos nas alíneas seguintes:

a) jud-eu
jud-aico
b) ajudeuz-ado c) ajudeiz-ar
ajudeiz-ado
d) juda-ismo e) judaiz-ante
judaiz-ar
f) judi-aria
judi-ação
judi-ar

 

Quanto a judia não parece que seja flexão de judeu, mas sim importação do castelhano 'judia', feminino de 'judío', segundo informa o Dicionário Etimológico de José Pedro Machado. E talvez seja verdade, porque o mesmo dicionário menciona um documento de 1328, em que há o feminino judea. O que será preferível? Pôr de lado judia ou integrá-la na família de judeu?

Vejamos a outra proposição:

02) A palavra «rejuvenescer» apresenta, simultaneamente, o prefixo «re-» e o sufixo «-escer».

Em rejuvenescer não há, realmente, a simultaneidade do acrescentamento de re-+-escere, porque este verbo, segundo o «Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa» de José Pedro Machado, provém do lat. 'juvenescere', a que se acrescentou o prefixo português re-. É termo usado em 1890, segundo o referido dicionário.

Também não parece formado de re-+juvenescer, porque este verbo está mencionado como neologismo na 10.ª edição do Dicionário de Morais de 1948.

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