É a questão da presença ou da ausência do artigo definido.
Talvez por influência do português do Brasil, estamos a omitir o artigo definido em casos em que ele deve existir. Eis algumas frases lidas em jornais:
- Apesar de terem sido os portugueses a introduzirem a cultura de amendoim...
- Ana M. S. Matos. Missa de 1.º aniversário.
- Junta de Freguesia da Pontinha.
Há dezenas de anos toda a gente dizia cultura do amendoim/feijão/milho, etc., porque se trata de um vegetal bem definido. O mesmo nos exemplos b. e c..
O emprego do artigo é assunto mais vasto do que pode parecer.
Eis algumas particularidades da presença do artigo definido, que se podem aplicar à questão, muito bem apresentada por Júlia Miguel:
- – Chama a atenção para determinado ser: Este lápis é o teu.
- – Lança mais visualidade sobre o que se diz: Camões, o grande poeta português, é uma figura universal.
- – É um elemento de clareza e de relevo: Agora, pouco se estuda o Portugal dos Descobrimentos.
É evidente que estas (e outras particularidades) são de natureza estilística, e não de natureza gramatical.
A língua/linguagem não é somente para ser compreendida. É também para ser sentida. Temos de a sentir para nos exprimirmos com perfeição.
Quem for ainda capaz de sentir a língua/linguagem qual das duas frases seguintes prefere?
- O ensino à distância é necessário e muito proveitoso.
- O ensino a distância é necessário e muito proveitoso.
A palavra distância tem aqui forte valor semântico, porque mostra a natureza do ensino que se exerce. Se suprimirmos o artigo definido, suprimimos ao substantivo distância parte desse valor que lhe pertence.
Mais ainda: o artigo antes de «ensino» é pronunciado de maneira débil, e até muito débil, por várias pessoas. Quando tal acontece, pode alguém interpretar como complemento directo o elemento a distância. E então poderá, de começo, perceber a seguinte frase:
[Eu] ensino a distância.
Isto poderá facilmente acontecer com a pronúncia de Lisboa, em que tanta gente «come» som, principalmente os vocálicos.
Concluindo: a linguagem preferível parece ser esta: «ensino/apoio/transmissão, formação, comunicação, etc., etc. à distância.» Sim... «tem mais vida!», como afirma a prezadíssima colega Júlia Miguel.
E agora... Peço licença!
Escreveu assim:
"É claro que conteúdos não devem ser sacrificados pela forma (...)."
Para que omitir o artigo definido antes de conteúdos? Então... porque não suprimi-lo também antes de forma: sacrificados por forma?... Seria mau português! Temos aqui outro valor semântico do artigo definido: a presença dele indica totalidade; a ausência indica, ou pode indicar, parcialidade. É o que vemos em conteúdos e os conteúdos. Digamos os conteúdos.
Se alguma dúvida permanecer, o Ciberdúvidas está ao dispor.
N. E. – Sobre o uso de «a distância» vs. «à distância», existem outras posições, nem sempre convergentes com a aqui exposta (ver Textos Relacionados, em baixo).