DÚVIDAS

Dever e ter de em normas oficiais

Consulto frequentemente o vosso sítio e desde já vos felicito pelo excelente trabalho.

Tenho um problema com a utilização do deve (opcional) ou tem de (obrigatório).

Uma norma (conjunto de regras a seguir) é (ou devia ser) escrita utilizando o princípio da clareza (linguagem clara e compreensível para todas as pessoas).

Sendo a frase:

«A entidade X deve escolher o método A ou o método B e deve aplicar o método escolhido no quadro 1.»

Neste caso, o «deve aplicar» está correcto, ou utiliza-se tem de ou mesmo o verbo na forma activa?

Outro caso:

«A entidade X deve garantir os items x, y e z.»

Se é uma norma (regra a seguir) obrigatória, o deve na frase torna a acção opcional.

Neste caso, penso que deveria ser «A entidade X têm de garantir...» ou «garante» de forma a a acção ou situação ser obrigatória.

Quando uma norma é transposta a aviso na legislação portuguesa através do princípio da legalidade (onde a norma fica submetida à lei), contendo o mesmo texto (com deve), como deve ser interpretada?

Este problema é claro na língua inglesa, onde shall e must são claramente opcional e obrigatório, respectivamente.

Mas a tradução de normas EN para PT origina muitas situações idênticas às referidas.

Como fica: deve, ou tem de?

Grato pela atenção.

Resposta

Os verbos auxiliares modais poder, dever e ter + de (ou ter + que) são utilizados para exprimir, respectivamente, a possibilidade, a probabilidade e a obrigatoriedade.

Porém, o verbo dever, em determinados contextos, é utilizado como expressão de obrigatoriedade, nomeadamente quando usado em documentos de carácter normativo (decretos-leis, normas...), pois pressupõe-se que esteja implícita a obrigatoriedade do cumprimento do que neles está enunciado. Ex: «Qualquer comunicação que, directa ou indirectamente, vise promover a prestação de serviços abrangidos pelo presente decreto-lei deve identificar de forma expressa e destacada o seu carácter de comunicação comercial» (Diário da República, 1.ª série – n.º 48 – 10 de Março de 2009, p. 1603). Neste tipo de documentos, quando se pretende veicular a ideia da não obrigatoriedade do exposto, opta-se pelo uso do verbo auxiliar modal poder. Ex. «Por resolução do Conselho de Ministros, pode ser centralizado na Direcção-Geral da Administração Pública o recrutamento para categorias de ingresso» (Decreto-Lei n.º 204/98, de 11 de Julho).

Deste modo, e nos casos concretos que refere, o verbo dever assume o mesmo valor de ter + de, isto é, de obrigatoriedade.

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