O que diz tem toda a lógica, mas a leitura da Base XXVIII do Acordo Ortográfico de 1945 deixa a grafia de Cristo Rei/Cristo-Rei nas mãos das práticas correntes. Transcrevo algumas passagens desse texto:
«[...] deveriam, em princípio, exigir o uso do hífen todas as espécies de compostos do vocabulário onomástico que estivessem em idênticas condições morfológicas e semânticas [dos substantivos compostos comuns]. Contudo, por simplificação ortográfica, esse uso limita-se apenas a alguns casos, tendo-se em consideração as práticas correntes. Exemplos:
a) nomes em que dois elementos se ligam por uma forma de artigo: Albergaria-a-Velha, Montemor-o-Novo, Trás-os-Montes;
b) nomes em que entram os elementos grão e grã: Grã-Bretanha, Grão-Pará ;
c) nomes em que se combinam simetricamente formas onomásticas (tal como em bispo-conde, médico-cirurgião, etc.): Áustria-Hungria, Croácia-Eslavónia;
d) nomes que principiam por um elemento verbal: Passa-Quatro, Quebra-Dentes, Traga-Mouros, Trinca-Fortes;
e) nomes que assentam ou correspondem directamente a compostos do vocabulário comum em que há hífen: Capitão-Mor, como capitão-mor; Norte-Americanos, como norte-americano; Peles-Vermelhas, como pele-vermelha; Sul-Africanos, como sul-africano; Todo-Poderoso, como todo-poderoso.
Limitado assim o uso do hífen em compostos onomásticos formados por justaposição de vocábulos, são variadíssimos os compostos do mesmo tipo que prescindem desse sinal; e apenas se admite que um ou outro o tenha em parte, se o exigir a analogia com algum dos casos supracitados ou se entrar na sua formação um vocábulo escrito em hífen: A dos Francos (povoação de Portugal), Belo Horizonte, Castelo Branco (topónimo e antropónimo; com a variação Castel Branco), Entre Ambos-os-Rios, Figueira da Foz, Foz Tua, Freixo de Espada à Cinta, Juiz de Fora, Lourenço Marques, Minas Gerais, Nova Zelândia, Ouro Preto, Ponte de Lima, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Santa Rita do Passa-Quatro, São [ou S.] Mamede de Ribatua, Torre de Dona [ou D.] Chama, Vila Nova de Foz Côa.»
Esta extensa citação pode resumir-se ao seguinte:
— o uso do hífen nos compostos onomásticos limita-se a alguns casos, tendo em conta as práticas correntes;
— em muitos compostos onomásticos não há hífen, a não ser que se faça a analogia com os casos hifenizados.
Como se vê, na onomástica reina uma grande liberdade, que muitos dos que me lêem agora acharão uma confusão. Em relação a Cristo Rei/Cristo-Rei, poderíamos argumentar que se trata de uma combinação simétrica como Áustria-Hungria e que a forma correcta é Cristo-Rei. Poderíamos até pensar na forma tenente-coronel, palavra constituída por dois substantivos tal como a que ora analisamos, para reforçar a nossa argumentação. Mas é o próprio Acordo de 1945 que nos deixa na incerteza, se quisermos rebater a defesa da forma Cristo Rei, sem hífen.
Deste modo, considero que, por enquanto, há duas formas legítimas, Cristo Rei e Cristo-Rei. Aparentemente, a prática corrente é usar Cristo-Rei, com hífen, para designar o monumento da Margem Sul, na área de Lisboa. Noutras zonas em que o nome também aparece, escreve-se sem hífen (por exemplo no Brasil).