O texto em causa parece pertencer a um registo escrito de um discurso oral, em que o emissor se dirige a outra(s) pessoa(s), negligenciando a construção frásica e omitindo partes/constituintes imprescindíveis a um discurso escrito correto.
Enquanto registo direto de enunciado oral – em que a pontuação/divisão de frases é evidenciada pela entoação, passando-se naturalmente de uma mensagem a outra –, marcado pela informalidade, desvaloriza a gramaticalidade do discurso, privilegiando o conteúdo da mensagem que pretende passar.
É o que se passa com o caso em referência. O enunciado que nos apresenta como uma única frase – «Qual a lotação e quantidade atual de funcionários hoje no cargo de servente e por lei quantos deveriam?» – contém duas frases/orações/mensagens, o que gera problemas a nível da concordância do predicado com o respetivo sujeito. E isso deve-se às elipses1 nas duas frases:
a) do predicado/verbo da 1.ª frase («é»), predicado este que é diferente do da 2.ª frase («deveriam ter» ou «deveria ter»).
b) do sujeito da 2.ª frase do qual dependerá a forma verbal – «deveria ter» ou «deveriam ter».
c) de «funcionários hoje no cargo de servente» representado pelo pronome interrogativo quantos, que, por ocorrer antes do predicado, pode gerar ambiguidades relativamente à sua função sintática.
Analisemos, então, o enunciado:
1.ª frase – «Qual [é] a lotação e quantidade atual de funcionários hoje no cargo de servente?»
2.ª frase – «E, por lei, quantos [funcionários hoje no cargo de servente] [vocês/as empresas/os serviços/as instituições] deveriam ter?» ou «E, por lei, quantos [funcionários hoje no cargo de servente][uma empresa/um departamento/uma instituição] deveria ter?»
Se nos debruçarmos sobre a 2.ª frase, verificamos que não haveria espaço para dúvidas relativamente à forma deveriam se o infinitivo com o qual forma predicado fosse o verbo ser (e não ter), ficando do seguinte modo: «E, por lei, quantos [funcionários hoje no cargo de servente] deveriam ser?»
Do mesmo modo que, se se optasse pelo infinitivo haver (com valor de «existir», em substituição de ter), deveria seria a forma correta — «E, por lei, quantos [funcionários hoje no cargo de servente] deveria haver?» —, não havendo a questão do sujeito, uma vez que, se trata de um caso de um verbo impessoal (haver = existir).2
1 Entende-se por elipse a «omissão numa frase, ou numa palavra, de elementos necessários à compreensão do sentido total», mas «que o contexto linguístico ou a situação permite recuperar» (Mira Mateus et alii, Gramática da Língua Portuguesa, 5.ª ed., Lisboa, Caminho, 2003, p. 871)
2Agradeço a colaboração de Luciano Eduardo Oliveira, que nos colocou esta outra perspetiva para a construção da frase.