Pegando nos exemplos apresentados pela consulente, (i) «por força da lei» ou (ii) «culpados à lupa» incluem efetivamente locuções, mais concretamente, locuções adverbiais: «por força» e «à lupa». Estas locuções são expressões com a mesma função dos advérbios, e a sua estrutura interna pode integrar os seguintes elementos: preposição seguida de substantivo ou adjetivo (ex.: «à alentejana»); preposição seguida de advérbio (ex.: «a bem»); dois advérbios (ex.: «agora mesmo»); dois advérbios e/ou preposições (ex.: «antes de mais»); dois nomes e/ou preposições (ex.: «ao fim e ao cabo») – combinações que podem incluir um advérbio com um nome ou um adjetivo ou um artigo ou, ainda, um pronome indefinido (ex.: «acima de tudo»). Assim, verificamos que nos exemplos apresentados temos em (i) uma preposição por seguida de um substantivo força e em (ii) à, que deriva da contração do artigo a com a preposição a, seguida de um substantivo, lupa.
Assinale-se que, quando se fala em locuções, tem de se ter em consideração que estas podem ser: adjetivas (ex. «da cor do mar», «de ouro»), adverbiais (ex.: «com cuidado», «às pressas»), conjuntivas (ex.: «posto que», «desde que»), interjetivas (ex.: «ora, bolas», «valha-me Deus»), prepositivas (ex.: «em cima de», «depois de»), substantivas (ex.: «estrada de ferro», «casa de saúde»), verbais (conjunções perifrásticas), conjuncionais coordenativas copulativas (ex.: «não só… mas também», «tanto… como»), conjuncionais coordenativas adversativas (ex.: «no entanto», «não obstante»), conjuncionais coordenativas disjuntivas (ex.: «ou… ou», «nem… nem»), conjuncionais coordenativas conclusivas (ex.: «por consequência», «por conseguinte»), conjuncionais subordinativas temporais (ex.: «antes que», «depois que»), conjuncionais subordinativas causais (ex.: «visto que», «já que»), conjuncionais subordinativas finais (ex.: «a fim de que», «para que»), conjuncionais subordinativas condicionais (ex.: «exceto se», «a não ser que»), conjuncionais subordinativas comparativas (ex.: «como… assim», «consoante… assim»), conjuncionais subordinativas concessivas (ex.: «ainda que», «posto que»), conjuncionais subordinativas. Assim, torna-se difícil enumerar todas elas. No entanto, em gramáticas como a Nova Gramática do Português Contemporâneo, de Celso Cunha e Lindley Cintra, Gramática da Língua Portuguesa, da autoria de Maria Helena Mina Mateus et al., e outras, encontram-se exemplos de muitas mais locuções.
Relativamente à confusão entre complementos circunstanciais e locuções, cria-se um contraponto entre as locuções, neste caso adverbiais, e os complementos circunstanciais. Primeiramente é importante ter-se presente que complementos circunstanciais são constituintes que contribuem para o significado do sintagma verbal, quantificando, classificando ou localizando (temporal ou espacialmente) a situação que se descreve, mas que não representam participantes na situação ou no evento descrito pelo verbo. Pelo contrário, as locuções são um conjunto de palavras que equivalem a um só vocábulo, por terem significado conjunto próprio e função gramatical única.
Ao falar-se em locuções adverbiais, verificamos que estas apresentam possibilidades muito reduzidas ou mesmo nulas de modificação interna dos elementos que as constituem e, nesse sentido, distinguem-se, na maior parte dos casos, dos complementos circunstanciais formados por sintagmas proposicionais regulares. Assim:
(v) «vou num cavalo»
(iv) «vou a cavalo»
Na primeira expressão é possível combinar o substantivo cavalo com um modificador (cf. «vou num cavalo {velho/que o meu pai me ofereceu}») e é possível por outro da mesma área semântica e que seja compatível com o resto da frase (cf. «vou num cavalo {burro/camelo}»). Estas possibilidades, em contrapartida, estão vedadas à locução adverbial «a cavalo».