Para melhor leitura de Aparição (1959), de Vergílio Ferreira, convém aproveitar o título e procurar entender a aparição do eu numa escrita até então voltada para o social de lição neo-realista. O porquê da vida quando a morte se torna inverosímil ou (como diz Maria do Céu Fialho num artigo já aqui referido dentro da bibliografia sobre esta obra) quando o homem vira «paixão inútil», eis o único problema que «inventa» o narrador de Aparição e será obsessivamente retomado por Vergílio Ferreira. O modo como tal inquirição ontológica se processa é que pede novas técnicas narrativas: Alberto convoca a alentejana Évora, onde fora professor, na memória que também se satura da casa beirã originária, onde tudo se escreve (ou inscreve, se lermos, igualmente, a figura do homem civil colada ao narrador). Espaço e tempo, por força dessa memória inquieta, dada em movimento de escrita, procuram, assim, convergir na identidade de quem, sentado em casa, se deixa arrastar. Para José Luís Gavilanes Laso (no seu Vergílio Ferreira. Espaço Simbólico e Metafísico, 1989), ligaríamos a casa à «epifania do eu», o que também será extensivo à ficção posterior deste autor. Mas nunca esquecendo essa escrita-grito contra a inutilidade da existência, na senda da reflexão existencialista que começava a vigorar entre nós.