Muito obrigado pelas suas observações.
Os dados, que ramos da investigação como a sociolinguística e a história da língua foram revelando, permitem concluir que há acordo quanto ao papel que alguns dialectos centro-meridionais portugueses (ver Lindley Cintra, Estudos de Dialectologia Portuguesa de Lisboa, 1983, págs. 117-163) tiveram na constituição da norma portuguesa. Assim, esta é definida por Celso Cunha e Lindley Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo (pág. 10), como o «conjunto dos usos linguísticos das classes cultas da região Lisboa-Coimbra». Nesta definição há, por um lado, a delimitação de um território (o Centro e o Centro-Sul) e, por outro, uma identificação de cariz sociológico (as chamadas «classes cultas»).
Quando se fala em dialecto de Lisboa ou em dialecto de Coimbra não se está, pois, a referir de forma genérica o falar popular do Centro de Portugal, embora haja semelhanças. Por exemplo, a pronúncia-padrão tem características que compartilha com outros dialectos do Centro e do Sul de Portugal, por exemplo: a monotongação do ditongo [ou], que se mantém no Norte de Portugal (a palavra ouro é pronunciada [ouro] no Norte, mas [ôro] no Centro e no Sul); e a distinção dos sons [b] e [v], que grande parte dos falantes do Norte não distingue [trata-se do chamado betacismo dos dialectos setentrionais portugueses]. No entanto, há também uma diferença, correspondente à evolução do ditongo [ei] (em madeira) no sentido de uma diferenciação dos seus elementos, a qual chegou à pronúncia [âi] (“mad[âi]ra”). Esta evolução diverge da que se regista na maior parte dos restantes falares centro-meridionais, nos quais se dá a monotongação de [ei] em [ê], como em “mad[ê]ra”.
Abordando directamente o problema da pronúncia de fecha, forma da flexão de fechar, admito que, como falante nado e criado na zona de Lisboa, f[âi]xa me pareça a mais corrente, porque vivo imerso num ambiente linguístico em que ela é dominante. Penso também que ela é corrente na rádio e na televisão. No entanto, estou pronto a aceitar que a norma deveria ser f[é]cho, de acordo com a regra sugerida, cujo modelo e cuja produtividade se apoiam na flexão de almoçar.
Mas também gostaria de notar que, se a vogal do radical do verbo é pronunciada como vogal aberta nas três pessoas do singular do presente do indicativo, tal regra pode encontrar dificuldades com o verbo fechar, por causa do contexto fonético. É que há a tendência para pronunciar e como [â] ou [âi] antes das consoantes palatais representadas por j e ch; por exemplo, diz-se cer[âi]ja e f[âi]cho (substantivo). Trata-se de uma tendência que o próprio Rebelo Gonçalves regista no seu Vocabulário da Língua Portuguesa (1966).