A expressão latina armenius mus não parece ter sido criada ou introduzida em latim clássico, dado que que não consta do Dictionnaire Gaffiot Latin-Français (1934), que dá primazia ao latim clássico, nem é registado por Charlton T. Lewis e Charles Short, em A Latin Dictionary (1879), cujas abonações são também maioritariamente de autores clássicos. A expressão que estas fontes registam é efetivamente, como diz o consulente, a expressão mus ponticus, ou seja, «rato do Ponto» (Ponto era a região no Norte da Ásia Menor, junto do mar Negro).
Sobre a etimologia de arminho, designação de um «mamífero carnívoro da fam. dos mustelídeos (Mustela erminea), encontrado na tundra euro-asiática e norte-americana; com cerca de 30 cm de comprimento, pelagem vermelho-acastanhada no verão e branca no inverno» e, por extensão de sentido, «[d]a pele ou o pêlo desse animal» (Dicionário Houaiss), José Pedro Machado, no seu Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa (1987), dá a seguinte informação:1
«Do cast[elhano] armiño, este, por sua vez, do francês hermine, ermine no [francês?] arca[aico], da denominação armenius mus, «rato da Arménia», porque estas peles vinham das terras que naquele tempo ficavam englobadas na designação geral da Arménia, todas próximas do Mar [sic] Negro, o que justifica o nome de ponticus mus usado em lat[im] clássico para o mesmo produto. Séc. XIII: "Vi coteiffes com arminhos", Afonso X, o Sábio, em C.B.N. [= Cancioneiro da Biblioteca Nacional], N.º [436]. Como adj. no séc. XIV: "...era forrado en penna armiña... e a penna he mais delgada que hũa penna armyña", Crónica Troiana, m Crest[omatia Arcaica de José Joaquim Nunes], p. 117 e 119 (Alex.).»2
As origens últimas de arminho devem, portanto, procurar-se no latim e no francês medievais — mas não só. O Online Etymology Dictionary, acolhe a forma inglesa ermine, também um empréstimo do francês antigo ermine, e sugere uma interferência germânica, devida à semelhança fonética de armenius (mus) com o nome sem relação etimológica, usado em dialetos germânicos para designar a doninha ou animais semelhantes: alto-alemão antigo harmo «arminho, doninha», a que correspondia a forma adjetival harmin; saxão antigo harmo; anglo-saxão hearma, «musaranho».
Em suma, parece que o étimo de de arminho é resultado do contacto de uma palavra latina e francesa alto-medievais com outra de origem germânica.3 A semelhança fonética terá favorecido a convergência das duas palavras, mais a mais, no contexto de uma língua como a francesa, que, embora românica, recebeu um forte superstrato germânico. Mais tarde, a palavra francesa chegou ao português por via do castelhano, muito provavelmente, a partir da segunda metade do século XI, no quadro da intensificação dos laços políticos e culturais dos reinos cristãos da Península Ibérica com as regiões a norte dos Pirenéus.
1 Machado não se afasta do que Joan Corominas defende no Breve Diccionario Etimológico de la Lengua Castellana (Madrid, Editorial Gredos, 1961), muito embora este não aponte a intervenção do francês. O dicionário da Real Academia Espanhola confirma a mediação francesa na transmissão do latim armenius, sem indicar a associação da palavra mus.
2 Refira-se que a Crónica Troiana é uma obra pertencente à literatura galega do séc. XIV.
3 Na Alta Idade Média, a relação do latim com as línguas românicas era muitas vezes de complementaridade (diglossia), nem sempre parecendo haver uma clara consciência de que o latim constituísse um idioma diferente. Foi no Norte da atual França que mais cedo que se começou a escrever em romance, como o atesta o célebre Juramento de Estrasburgo (842), em que se promove o uso escrito do romance francês, já num processo de diferenciação do latim. A versão em língua germânica do mesmo documento testemunha também a diversidade linguística dos territórios centrais do antigo império de Carlos Magno (c. 742-814), nos quais seriam estreitos os contactos culturais e linguísticos entre comunidades românicas e germânicas, gerando situações de bilinguismo que muito marcaram o francês medieval e de que há também vestígios em línguas germânicas como o alemão e o neerlandês (o inglês também deverá ser mencionado, embora a relação com o mundo românico tenha especificidades).