Susana Ramos - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Susana Ramos
Susana Ramos
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Licenciada em Estudos Clássicos pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e pós-graduada em Ensino do PLE/L2 pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Foi docente de Português L2/LE no Instituto Camões em Paris entre 2009 e 2010 e professora estagiária de PLE/L2 na Faculdade de Letras da Universidade do Porto entre 2010 e 2011.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Qual ou quais as expressões certas numa despedida: «até sábado», «até ao sábado», ou «até o sábado»? Quer dizer, até + qualquer dia da semana.

Muito obrigada.

Resposta:

Embora os nomes dos dias da semana sejam precedidos de artigo definido quando ocorrem depois de preposições («no sábado»; cf. Celso Cunha e Lindley Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, p. 219/220, 2002), o uso de até, nas fórmulas de despedida e mesmo para definir, em geral, o limite de um intervalo de tempo, é feito sem artigo com qualquer nome relativo aos dias da semana, desde que este ocorra sem qualquer especificação: «Então, até sábado»; «A documentação deve ser entregue até sexta-feira» (mas «até à última sexta-feira de cada mês»).

Refira-se que, no Corpus do Português, por exemplo, a expressão «até sábado» tem 28 ocorrências como em:

(1) «Bem, até sábado. Não esqueça o beijinho para o neto» (Eça de Queirós, A Ilustre Casa de Ramires), e a expressão «até ao sábado» não tem nenhuma.

Pergunta:

Minha dúvida é a respeito da colocação do pronome se.

Na frase abaixo, que foi retirada de de uma lei, o se está colocado antes do advérbio:

«Ressalvado o disposto no parágrafo único do artigo anterior, o documento particular, de cuja autenticidade se não duvida, prova que o seu autor fez a declaração, que lhe é atribuída.»

Qual é a regra nestes casos?

Obrigado.

Resposta:

De facto, quando numa oração temos uma palavra negativa1 sem pausa entre ela e o verbo, dá-se a próclise, isto é, os pronomes átonos vêm antes do verbo, como vemos na Nova Gramática do Português Contemporâneo (Celso Cunha e Lindley Cintra, 17.ª ed., Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 311):

Não lhes dizia eu?

(Mário de Sá-Carneiro, CF, 348)2

No entanto, «costumam os escritores do idioma, principalmente os portugueses, inserir uma ou mais palavras entre o pronome átono em próclise e o verbo, sendo mais comum a intercalação da negativa não»:

Era impossível que lhe não deixasse uma lembrança.

(Machado de Assis, OC, I, 563)»3 (idem, p. 314).

1Como não, nunca, jamais, ninguém, nada, etc.

2 Mário de Sá-Carneiro, Céu em Fogo, 2.ª ed. Lisboa, Ática, 1956.

3 Machado de Assis, Obra Completa, Rio de Janeiro, Aguilar, 1959.

Pergunta:

Porque não se escreve século com c, já que quer dizer «cem anos»?

Resposta:

Embora cem (do latim centum) se escreva com c, a palavra século, que significa «um período de cem anos» (Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora), deriva do étimo latino saeculum, i (idem). Em língua portuguesa, podia ser aceite a grafia "céculo", já que podem escrever-se as fricativas linguodentais s ou c antes das vogais e ou i em início de palavra, mas, neste caso, manteve-se a grafia etimológica, tal como acontece em outras línguas românicas, como o espanhol (siglo), o catalão (segle), o francês (siècle), o italiano (secolo) ou o romeno (secol)1.

1O léxico romeno também dispõe do sinónimo veac, de origem eslava.

Pergunta:

Qual é origem da palavra pintarroxo? A questão tem que ver com a cor da ave na época de acasalar, que fica vermelha? Porque «pinta roxo» e não «pinta vermelho»?

Resposta:

Pintarroxo deriva do espanhol pintarrojo, ou seja, trata-se de uma palavra composta do verbo pintar e do adjetivo rojo, «vermelho» (cf. Dicionário Eletrónico Houaiss). Na adaptação à língua portuguesa, o vocábulo não se alterou, apesar da cor do pássaro, que efetivamente tem uma cor avermelhada.

Pergunta:

Gostaria de saber se utilizamos «testemunhar», ou «testemunhar de».

Exemplo: «Os objetos encontrados testemunham (de) uma época rica.»

Obrigada.

Resposta:

O verbo testemunhar, que significa «dar testemunho de, confirmar, ver ou depor como testemunha» (Dicionário Priberam da Língua Portuguesa), pode ocorrer ou não seguido da preposição de, a qual tem o valor de «acerca de», «sobre» e «a respeito de», tal como se verifica no Dicionário Prático de Regência Verbal, de Celso Pedro Luft (São Paulo, Editora Ática, 2003): «Testemunhar dos (ou sobre os) atos de alguém, na aceção de «dar testemunho (acerca de)»1.

Vejamos os exemplos:

a) «O Paulo testemunhou o acidente.»

b) «Nós testemunhamos da sua boa-fé.»

c) «Os objetos encontrados testemunham uma época rica.»

d) «Os objetos encontrados testemunham de uma época rica.»

Em a), o verbo testemunhar é seguido de complemento direto e tem o sentido de «declarar ter visto» ou «presenciar»: «O Paulo presenciou o acidente.»

Em b), o verbo testemunhar é seguido da preposição de e tem o sentido de «acerca de», de «manifestar ou ser sinal de alguma coisa» ou «certificar a verdade de uma afirmação»: «Nós conferimos a verdade acerca da sua boa-fé.»

Em c), o verbo testemunhar significa «revelar» ou «mostrar»: «Os objetos encontrados mostram uma época rica

Em d), testemunhar de tem o valor de «ser sinal de»: «Os objetos encontrados conferem a verdade acerca de uma época rica» ou «Os objetos encontrados são sinal de uma época rica.»

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