Sara Mourato - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara Mourato
Sara Mourato
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Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2 pela mesma instituição. Com pós-graduação em Edição de Texto pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, trabalha na área da revisão de texto. Exerce ainda funções como leitora no ISCTE e como revisora e editora do Ciberdúvidas.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

«Sou pró-União Ibérica.»

Neste caso, o hífen está bem colocado?

Mesmo sendo «União Ibérica» uma expressão composta, não leva hífen?

Obrigada.

Resposta:

Pró-União Ibérica está bem grafado, com hífen. 

Apesar de estarmos perante uma denominação composta não hifenizada (a União Ibérica é a unidade política que regeu a Península Ibérica de 1580 a 1640), as regras da hifenização prefixal mantêm-se.

Neste caso, pró- (um prefixo com o sentido genérico de «a favor de» e que evoluiu do prefixo de origem latina pro-)por ser um prefixo tónico acentuado graficamente, separa-se do segundo elemento por hífen, quando este «tem vida à parte» (Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, base XV). Veja-se o caso de pró-União Europeia, expressão que integra União Europeia, que não se hifeniza, mas que exibe hífen depois do prefixo pró- (ver aqui).

Pergunta:

Há quem diga por aí afora que provavelmente significa «possivelmente», assim como há quem diga que significa «certamente».

Porém, pelo menos para mim, possivelmente não quer dizer que seja a mesma coisa que certamente!

Estou certo? Qual dos dois é o significado da palavra provavelmente na realidade?

Muitíssimo obrigado e um grande abraço!

Resposta:

Provavelmente pode ser sinónimo de certamente e possivelmente, quando estes advérbios significam talvez:

«[provavelmente] 1. indica probabilidade, alta possibilidade de (alguma coisa); seguramente, certamente, com certeza (ex.: "ele não veio; provavelmente, a mãe está doente"); 2. indica incerteza, dúvida; pode ser, talvez, possivelmente (ex.: "ele provavelmente virá no fim do mês", "provavelmente, amanhã eu terei algumas horas livres")»; «[certamente] modifica frase, acrescentando noção modal de não absoluta certeza, de que o falante acha altamente provável aquilo que diz, mas não total segurança (ex.: "ele certamente estará aqui para a reunião")» (Dicionário Houaiss).

Note-se, porém, que certamente também funciona como sinónimo de sim e, aqui, não é sinónimo de provavelmente: «[certamente] usa-se como resposta afirmativa; é claro, sim, sem dúvida (Ex.: "- Quer ir conosco? - Certamente.")» (ibidem). 

Provavelmente é, portanto, sinónimo de certamente e possivelmente, mas em aceções ligeiramente diferentes quanto ao grau de certeza ou dúvida:

Assim, a frase «ele provavelmente virá no fim do mês» é interpretável de dois modos:

1) Ele virá certamente no fim do mês» (= «ele virá no fim do mês e conta-se com isso»);

2) Ele virá possivelmente no final do mês. (= «ele pode não vir, não há grande certeza»).

Pergunta:

Tenho nome composto.

«Maria do Carmo», ou «Maria Do Carmo», é o que tenho escrito nos últimos 13 anos (desde que sei ler e escrever).

Contudo, tenho reparado, sucessivamente, que os meus professores, colegas e até desconhecidos escrevem o meu nome com o d em minúscula. Isto fez-me questionar se, sabe-se lá como, tenho escrito mal o nome.

Embora tenha pesquisado, nada encontrei sobre o assunto.

Dessa forma questiono-me: a preposição/ contração de preposição entre dois nomes próprios (reitero o exemplo do «Maria/Do Carmo») é em maiúscula, minúscula, ou é realmente indiferente?

Obrigada.

Resposta:

A contração do do nome da consulente – «Maria do Carmo» – deve grafar-se com inicial minúscula. 

Nos nomes próprios (incluindo os topónimos ou os nomes de instituições e organizações) escrevem-se com inicial maiúscula «as palavras pertencentes às classes lexicais abertas (substantivos e adjetivos) [...]».

Em contrapartida, escrevem-se com letra minúscula inicial as palavras pertencentes a classes gramaticais fechadas, usadas não só em nomes próprios de base descritiva como em muitos topónimos e antropónimos canónicos: em particular, a preposição de, a conjunção coordenativa e e o artigo definido [...]» (Raposo et al.. Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, p. 1010). O que se diz acerca da preposição de, abrange as contrações do(s) e da(s).

Assim, temos, por exemplo, «António de Carvalho», «Eça de Queirós», «Museu Nacional de Arte Antiga», «Maria do Carmo», «Vila do Conde», «Manuel dos Santos», «Maria das Dores».

Pergunta:

Coetâneo e contemporâneo são sinónimos?

Sempre considerei que o primeiro identificaria dois entes de igual idade e o segundo dois entes que coexistem ou coexistiram em algum tempo, mas vejo ambos os termos usados indiferentemente.

Resposta:

De acordo com o Dicionário Houaisscoetâneo contemporâneo são sinónimos, isto é, são adjetivos e substantivos masculinos que significam «que ou o que viveu/existiu na mesma época». Contudo, tal como o consulente afirma, coetâneo também significa «que ou o que é da mesma idade; coevo». Também contemporâneo pode ser utilizado com o significado de «que ou o que é do tempo atual». Vejam-se os seguintes exemplos:

(1) «os coetâneos de Machado de Assis».

(2) «A arte contemporânea é difícil de interpretar».

Neles, coetâneos contemporânea não são sinónimos, pois em (1) quer dizer-se «as pessoas da mesma idade de Machado de Assis» e em (2), «a arte da atualidade é difícil de interpretar». 

Pergunta:

Na área das tecnologias da informação surgiu um termo nos últimos anos que tenho visto escrito de várias formas. O termo vem do inglês microservice.

Em português qual é a forma correta de o escrever?

Tenho visto "microsserviço", "microserviço", "micro serviço" e "micro-serviço".

Resposta:

Em português, microservice é traduzido por microsserviço, que significa «nos programas de informática (software), pequeno serviço independente que comunica com outro mediante um interface de programação de aplicações (API)»1.

A grafia deste substantivo faz-se com o prefixo micro aglutinado ao substantivo serviço. Acontece que, nas formações com prefixos e «com elementos não autónomos ou falsos prefixos, de origem grega e latina»2, como é o caso de micro-, se «o segundo elemento começar por r ou s», os constituintes aglutinam-se e as referidas consoantes devem duplicar-se, «prática aliás já generalizada em palavras deste tipo pertencentes aos domínios científicos e técnico»3.

 

1 Ver "O que são micorsserviços?", Amazon Web Services – AWS (consultado em 09/01/2023).

2 Base XVI do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa no Portal da Língua Portuguesa.

3 Ibidem.