Maria Regina Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Sou professora do 1.º C. E. B. e encontro-me a frequentar uma formação " Sorrir com os erros e não rir dos erros", na E. S. E. da Guarda.

Gostaria de ser esclarecida acerca do uso da palavra "depós", que li na obra "Viagens na Minha Terra". Deve entender-se como "depois"? Ainda está em uso?

Obrigada.

Resposta:

Depós é uma preposição que significa "após", "depois de". Na Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, vem abonada pela seguinte expressão, retirada de Camilo, Como os Anjos se Vingam, I, 1, p. 217: "João Lobo vem saindo do quarto ao fundo. Albertina sai depós ele." Está registada nos bons dicionários, e assinalada como pouco usada, por exemplo, no Dicionário Novo Aurélio Século XXI (1999).

Pergunta:

Solicito a gentileza de esclarecer qual(is) das formas abaixo está(ão) correta(s) e, se possível, justificar a resposta:

1) Transmiti minha declaração de imposto de renda via Internet.
2) Transmiti minha declaração de imposto de renda pela Internet.
3) Transmiti minha declaração de imposto de renda através da Internet.
4) Transmiti minha declaração de imposto de renda por meio da Internet.
5) Transmiti minha declaração de imposto de renda por intermédio da Internet.

Agradeço antecipadamente pela resposta,

Resposta:

Vou referir-me a cada uma das formas:

1. via "Internet" – está correcto este emprego. Trata-se de uma fórmula já tipificada no envio de correspondência (via aérea, por exemplo).
2. pela "Internet" – expressão também correcta. A preposição "por" utiliza-se neste sentido, como nas expressões "por telefone", "por fax".
3. através da – não é de aconselhar este emprego. A locução significa de ponta a ponta, de um lado ao outro, por entre, pelo meio de (ex.: através da parede, do vidro da janela; através dos tempos).
4. por meio da – não é correcta esta utilização. A locução significa por intervenção de, por interferência de, pela adopção de um determinado procedimento (ex.: por meio dos amigos, conseguiu o que queria; por meio de belas palavras, encantou toda a gente).
5. por intermédio da – não é correcto este emprego. A locução significa pela intervenção de alguém, porque houve mediação de algo ou alguém, porque alguém serviu de medianeiro (ex.: conheceu o futuro marido por intermédio da irmã).

Pergunta:

Existem as palavras portuguesas "anacrese" e "sincrese"? Que significado têm? (penso que se referem a um âmbito filosófico). Se não existem, qual a tradução das palavras (francesas) do título? Imensamente grato.

Resposta:

As palavras que refere não existem em português assim escritas. Provêm ambas do grego: Segundo o Prof. Doutor Mário Santiago de Carvalho, da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra – cujo precioso contributo agradecemos -, em dois fragmentos de Aristóteles, 374 e 375 , registados no Index Aristotelicus, da autoria de H. Bonitz (Akademische Druck, Graz, 1955, 2ª edição), páginas 1540a40 e 1540b14, 22, regista-se a expressão anákrisis thesmotheton, que quer dizer "instrução judicial dos tesmótetas" (nome dado aos Arcontes encarregados de rever as leis, anualmente). O mesmo Aristóteles, agora na sua Metafísica (página 984a 10), referindo-se à teoria dos quatro elementos de Empédocles, emprega conjuntamente os verbos synkrinómena e diakrinómena, respectivamente, movimentos de junção e de separação, ambos explicando a constituição dos seres com base no elemento Terra. Sýnkrisis e anákrisis são, pois, dois termos técnicos da cultura grega familiares a Aristóteles. Anákrisis teria o sentido de investigação ou de instrução judicial, acepção aliás registada em Isidro Pereira, no seu dicionário de Grego-Português, e sýnkrisis, o de junção. Em síntese: "anákrisis" – significa investigação, instauração judicial, objecção, réplica. "sýnkrisis" (latim: syncrise-) - deu origem ao termo português "síncrise", com os seguintes significados: oposição, antítese, contradição; reunião de duas vogais num ditongo; (Quím. ant.) coagulação de líquidos misturados; (Alq.) passagem de um corpo líquido ao estado sólido e, também, coagulação ou solidificação de dois líquidos misturados. Quanto à tradução de anákrisis, ela não deve ser feita do francês, mas do grego ou do latim. À semelhança de outros termos relacionados (diácrise e síncrise), deverá traduzir-se por anácrise. Se quiser fazer o favor de enviar uma passagem textual em que os termos franceses estejam utilizados, poderá ser possível um melhor esclarecimento.

Pergunta:

Gostaria de saber se está correta a frase seguinte quanto ao uso da vírgula e quanto à concordância do verbo dever:

O tamanho grande do animal, aliado à sua ferocidade, deve ser o motivo principal da criação da raça estar em declínio.

São obrigatórias as vírgulas aí colocadas? O verbo fica no singular ou o sujeito é composto e ele deve ir para o plural?

Resposta:

Há muitas formas de exprimir uma ideia. Quem domina a escrita sabe que a opção por uma construção sintáctica se deve subordinar ao que se pretende transmitir. A sintaxe fornece os meios de tornar claro o pensamento.

Ora a frase que me apresenta, sinceramente, tem uma construção que não contribui de forma nenhuma para a clareza do que se pretende transmitir:

a) Quantos são, afinal, os motivos que levam a que a criação da raça esteja em declínio? Um (o tamanho)? Dois (o tamanho e a ferocidade)?
b) Ao referir-se "motivo principal", só se pode aceitar um motivo (singular). Será que o tamanho, por si só não era motivo, a ferocidade por si só também não, mas, sim, a simultaneidade das duas características?
c) Ou será que o motivo principal era mesmo o tamanho, mas o falante quis referir a ferocidade como um secundário, mas que também tinha responsabilidades no declínio da criação daquela raça de animais?
d) De que é que se pretende falar? Qual é o sujeito, o assunto, o tema desta frase? Não será o motivo que levou ao facto de a criação daquela raça estar em declínio? Não é disso que se está a falar, do motivo? Então, esse é que devia ser o sujeito.
e) "O motivo principal" diz respeito ao declínio da criação, ao facto de haver declínio na criação de, etc. No entanto o sintagma "o motivo principal" está imediatamente ligado a "da criação da raça". Quem lê, imediatamente associa o motivo à criação e não ao declínio, que só aparece depois.

Como está a ver, a frase deveria ser remodelada. Parece tratar-se de um excerto de discurso oral que se passa a escrito. No entanto, respondo-lhe ao que pergunta, analisando essa construção que me apresenta:

A frase está redigida com um sujeito no singular (o grande tamanho do animal), seguido de outro no singular (a ferocidade), ligados por um...

Pergunta:

Gostaria que me sugerissem um manual para ensinar português a estrangeiros.

Resposta:

Não conheço todos os manuais que se publicam em Portugal para este efeito. Receio omitir o título de algum bom manual. Sugiro a deslocação a algumas livrarias e a consulta das obras, para poder fazer a escolha, segundo o público que tem e os aspectos que pretende evidenciar. Alguns títulos: – Portuguesíssimo - Manual de Iniciação à Língua Portuguesa para Estrangeiros, de Maria de Fátima Braga de Matos, Porto Editora; – Português Língua Viva, de Mendes Silva, Ed. Teorema; – Português sem Fronteiras, de Isabel Coimbra Leite e Olga Mata Coimbra, Ed. Lidel; – Lusofonia - Curso Básico de Português, Língua Estrangeira, de António Avelar e Helena Bárbara Marques Dias (dir. Dr. Malaca Casteleiro), Ed. Lidel; – Lusofonia - Curso Avançado de Português, Língua Estrangeira, de António Avelar e Helena Bárbara Marques Dias (dir. Dr. Malaca Casteleiro), Ed. Lidel.