Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
Eunice Marta
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Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Leciono o 2.º ciclo e vamos entrar nas funções sintáticas. Há novo programa e um exame nacional no fim do ciclo. E há um grande problema de consciência para mim. Passo a explicar.

Por decreto, o DT impõe que os verbos constantes de uma determinada lista implicam sempre um nome predicativo do sujeito. Ora, isto ofende aquele princípio básico e indiscutível que obriga a tratar diferentemente o que é diferente. E a diferença, neste caso, não está nesse grupo de verbos, mas na natureza do referido predicativo – incide diretamente no sujeito e com ele coincide, considerando-o como um todo. Ex.: «Ele está doente.» Ora, isto é bastante diferente de «Ele está em casa». Aqui, a expressão «em casa» não incide diretamente no sujeito e muito menos coincide (se identifica) com ele. Este verbo (predicador) não é copulativo, mas incorpora aquela expressão, primeiro, e só depois realiza a predicação. Ou seja, aquela expressão é predicativo do predicador e não do sujeito.

Nota: Uso aqui a nomenclatura tradicional, porque, em rigor, todo o predicado e o predicado todo são predicativo do sujeito...

Estando disto convencido até prova em contrário, como posso eu, que, antes do português, promovo a lealdade na relação com os alunos, dar-lhes coelho por lebre?!

Resposta:

O predicativo do sujeito, tal como o consulente explicita, predica o sujeito, ou antes, «algo acerca do sujeito» (DT). Ora, isto significa que o predicativo do sujeito contribui para a identificação e a caracterização do sujeito, pois assim como ocorre a conferir propriedades ou características — razão pela qual pode ser um grupo nominal ou adjetival — também atribui uma localização temporal ou espacial (surgindo como grupo adverbial ou preposicional).

Repare-se que todo esse tipo de informação (propriedade, característica, localização temporal e espacial) são elementos de identificação do sujeito. Por exemplo, quando se diz «O Pedro é professor de Português», «O Pedro é moreno», «O Pedro está ali», «O Pedro está naquela sala», estamos a identificar o Pedro.

A questão apresentada pelo consulente deve-se, sobretudo, ao facto de nos termos habituado a considerar como predicativo do sujeito somente elementos caraterizadores desse mesmo sujeito, não abrangendo outras marcas de identificação. Mas importa reparar, também, que a própria nomenclatura da gramática tradicional continha imprecisões, pois como se explica que se classificasse como nome predicativo do sujeito um adjetivo? Por exemplo: «Ele é inteligente.» Por essa lógica, só os nomes/substantivos integrariam essa função! Então, somente em frases como «O Luís é engenheiro/médico/lavrador/poeta/músico», em que o predicativo fosse um nome/substantivo, é que predicava o sujeito?

É de referir também que o próprio Dicionário Terminológico nos esclarece que «é possível constatar que expressões com valor locativo selecionadas por verbos copulativos desempenham a função de predica...

Pergunta:

Coletivos das palavras foguetes, cebolas alhos e lenha.

Resposta:

Segundo o Dicionário de Nomes Colectivos (Lisboa, Europa-América, 2006), de Fernanda Carrilho, há vários coletivos para as palavras apresentadas:

foguetes: descarga (lançados ao mesmo tempo); foguetada; foguetaria; fogueteada; foguetório; girândola; molho;

cebolas: cabo; cebolal; enfiada (cebolas atravessadas pelo mesmo fio); rastra; réstia; trança (cebolas quando entrelaçadas);

alhos: alhada; alhal; cabo; cambada (alhos ligados uns aos outros); enfiada (alhos atravessados pelo mesmo fio); rastra; réstia; trança (alhos entrelaçados),

lenha: bagaçada (lenha miúda); bardia (lenha junto à habitação); braçada (quando se pode cingir com os braços de uma só vez); braçado; feixe (lenha quando atada ao meio); lio; meda (feixes); molho; trancaria.

Pergunta:

Como se faz a divisão silábica das palavras pessoa e relógio?

Resposta:

A divisão silábica tem por base a pronúncia das palavras e faz-se por soletração, mas assenta na grafia convencionada para a mudança de linha (translineação).

As regras para a divisão silábica – da gramática tradicional e da Base XX, do atual Acordo Ortográfico – determinam que, nos casos de grupos consonânticos em que as «consoantes são iguais, estas separam-se obrigatoriamente» (José Nunes de Figueiredo e António Ferreira, Compêndio de Gramática Portuguesa, Lisboa, Bertrand, 1965, p. 43).

Assim, a divisão silábica de pessoa é feita do seguinte modo: pes•so•a.

Por sua vez, tanto o AO como a tradição aconselham que as «vogais consecutivas que não pertencem a ditongos decrescentes (as que pertencem a ditongos deste tipo nunca se separam: ai-roso, cadei-ra, insti-tui, ora-ção, sacris-tães, traves-sões) podem, se a primeira delas não é u precedido de g ou q, e mesmo que sejam iguais, separar-se na escrita» (AO), ou seja, «podem separar-se as vogais ou ditongos decrescentes» (José Nunes de Figueiredo e António Ferreira, ob. cit...

Pergunta:

Gostaria de ver esclarecida a seguinte dúvida: Qual a razão de, na frase «O João está ali», ali desempenhar a função sintática de predicativo de sujeito?

Resposta:

O facto de estarmos em presença de uma frase com um verbo copulativo1está – implica a ocorrência do sujeito e do predicativo do sujeito, «função sintática desempenhada pelo constituinte […] que predica algo acerca do sujeito» (Dicionário Terminológico), atribuindo-lhe uma propriedade/ caraterística (ex.: «O João é simpático») ou uma localização temporal (ex.: «O João está hoje connosco») ou espacial (ex.: «O João está aqui/em Lisboa/na escola»), contribuindo para a identificação do sujeito.

Por isso, o predicativo do sujeito pode ser um grupo nominal (ex.: «O João é [professor de Matemática]»), um grupo adjectival (ex.: «O João está muito cansado»), um grupo preposicional (ex.: «O João está no colégio») ou um grupo adverbial (ex.: «O João está aqui» (idem).

Importa referir, também, que o próprio Dicionário Terminológico nos esclarece que «é possível constatar que expressões com valor locativo selecionadas por verbos copulativos desempenham a função de predicativo do sujeito, porque podem ser coordenadas com outros constituintes com a mesma função, independentemente do seu valor: O João está [em Paris e muito doente]».

1São considerados verbos copulativos os seguintes:« ser (i), estar (ii), ficar (iii), parecer (como em "parecer doente"), permanecer, <...

Pergunta:

Gostaria de saber como se processa a divisão silábica das palavras ritmo e rítmico.

Resposta:

A divisão silábica tem por base a pronúncia das palavras e faz-se por soletração, mas assenta na grafia convencionada para a mudança de linha (translineação).

As regras para a divisão silábica — da gramática tradicional e da Base XX, do atual Acordo Ortográfico — determinam que, nos casos de palavras com duplas consoantes, «são divisíveis no interior da palavra as sucessões de duas consoantes que não constituem propriamente grupos» (AO), ou seja, «conserva-se sempre na sílaba que a precede a consoante não seguida de vogal» (José Nunes de Figueiredo e António Ferreira, Compêndio de Gramática Portuguesa, Lisboa, Bertrand, 1965, p. 42). Por isso, a divisão silábica das palavras indicadas pela consulente é feita da seguinte forma: rit•mo (rit-mo) e rít•mi•co (rít-mi-co).

Nota: Para os casos de dúvida sobre divisão silábica, acentuação e sílaba tónica (para além da grafia), aconselha-se a pesquisa no Portal da Língua Portuguesa e no Dicionário da divisão silábica, recursos disponíveis da responsabilidade do ILTEC, que respeitam o novo Acordo Ortográfico.