Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
Eunice Marta
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Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

O dicionário do meu Ms Word diz-me que curibeca está bem escrito e kuribeka não...

Eu suponho saber que a palavra entrou no português a partir do umbundo, uma língua banta de Angola. Alguém me esclarece sobre a grafia, origem e significados inicial e actual da palavra, em umbundo e em português?


Resposta:

De facto, a grafia correta (segundo o Vocabulário Ortográfico do Português, da responsabilidade do ILTEC, e o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2009, p. 180) é, precisamente, curibeca (com c e não com k).

Pode parecer estranho, mas os dicionários etimológicos consultados [Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa (Lisboa, Livros Horizonte, 1987), de José Pedro Machado; Grande Dicionário Etimológico-Prosódico da Língua Portuguesa (São Paulo, Ed. Saraiva, 1963), de Francisco Silveira Bueno] não registam a palavra curibeca, o que nos impede de conhecer os meandros da sua origem.

No entanto, o Grande Dicionário da Língua Portuguesa (da Porto Editora, 2010, p. 460) atesta curibeca (nome feminino) como termo do Brasil, «de origem obscura», que significa «conluio de pessoas com fins aparentemente honestos, mas com intenções pouco escrupulosas; maçonaria». Identificado como vocábulo do português do Brasil, «de origem obscura», estranha-se que não se encontre registado em nenhum dos dicionários brasileiros consultados (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa) nem no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras.

Nota: Como o consulente relaciona essa palavra ao umbundo, o que não é confirmado pelo dicionário que a atesta, não podemos deixar de referir que o Grande Dicionário da Língua Portuguesa contempla duas outras palavras bastante idênticas à citada, curibotar (verbo) e curibotice (nome/substantivo feminino), do português de Angola, resultante...

Pergunta:

Qual o nome coletivo que se emprega para animais de grande porte, exemplo: dinossauros?

Resposta:

Na pesquisa realizada em bibliografia específica1 sobre coletivos, não encontrámos nenhum registo do coletivo de dinossauros.

No entanto, há duas formas usadas para designar os nomes coletivos de animais de grande porte: manada [de búfalos, de elefantes, etc.] e armento [de gado grande: búfalos, etc.] (cf. Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 179 ).

1 Bibliografia específica: Fernanda Carrilho, Dicionário de Nomes Coletivos, Lisboa, Europa-América, 2006; Luiz Autuori e Oswaldo Proença Gomes, Nos Garimpos da Linguagem, 1959 (capítulo XI, «Coletivos»).

Pergunta:

«As segundas-feiras faço ginástica», ou «a segunda-feira faço ginástica» (referindo todas as segundas)?

Resposta:

Tanto a forma singular (segunda-feira) como a forma plural (segundas-feiras), nesse contexto, têm o mesmo sentido: «todas as segundas-feiras», razão pela qual é facultativo o uso de uma ou de outra forma.

No entanto, para que a frase fique correta, deverá usar à ou às (em vez do  artigo/determinante definido a) a preceder segunda(s)-feira(s), porque é a presença da preposição a [que aqui ocorre na contração/crase à(s)= a (prep.) + a(s) art.] que confere o valor de situação no tempo. Por isso, as formas corretas são:

«À segunda-feira faço ginástica» e «às segundas-feiras faço ginástica».

Repare-se que o sentido é diferente quando se usa o artigo, pois este é simplesmente um designativo. Exemplo: «A segunda-feira é o meu pior dia de trabalho.»

Cf. Por que razão não chamamos «primeira-feira» à segunda-feira? + A origem dos no...

Pergunta:

Relativamente à palavra cabeçudo, classificam-na apenas como adjetivo, ou também consideram um nome (substantivo) comum?

Estas dúvidas têm surgido e dando algum alarido na escola.

Resposta:

De facto, a palavra cabeçudo pertence a duas classes de palavras:

– nome comum (no grau aumentativo, de cabeça), usado para designar o «boneco de grandes dimensões e cabeça grande, frequente em cortejos alegóricos e festejos populares». Exemplo:
«Nos desfiles das festas populares, os cabeçudos marcam sempre presença.»

– adjetivo, que pode ter dois sentidos:
1)  que tem cabeça grande». Exemplo: «Ele tem uma cara bonita, mas é  cabeçudo.»
2) teimoso; estúpido (em sentido figurado). Exemplo: «Ele é muito simpático, mas é mesmo cabeçudo, teima sempre até ao fim.»

Pergunta:

Surgiu-me uma dúvida. Não sei como se escreve: se é «dirigo-me», ou «dirijo-me». E não sei se é correto dizer «me dirijo» ou «me dirigo».

Resposta:

A grafia correta da 1.ª pessoa do presente do indicativo da conjugação pronominal do verbo dirigir-se é dirijo-me, porque é necessário o uso da consoante j neste caso, ou seja, antes da vogal o, para que se mantenha o mesmo som da consoante fricativa palatal [como em já, gelo, dirigir].

Se se mantivesse o g (do infinitivo dirigir) nessa forma verbal, pronunciar-se-ia como som de g [como em golo ou golpe ou guloso], e não de j. Não nos podemos esquecer de que a consoante g, antes das vogais i e e, é equivalente ao som de j. Exemplos: adágio, algema, dirigir (mas dirijo) estrangeiro, girafa, fu