Edite Prada - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Edite Prada
Edite Prada
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Edite Prada é consultora do Ciberdúvidas. Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, variante de Português/Francês, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa; mestrado interdisciplinar em Estudos Portugueses, defendido na Universidade Aberta de Lisboa. Autora de A Produção do Contraste no Português Europeu.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

«Por entre choros e soluços, correu para a rua com a vaga intenção de ir a qualquer parte, imediatamente, fosse onde fosse, ao encontro da justiça.»

Na frase acima, não estaria melhor «fosse aonde fosse», uma vez que a referência é o verbo ir?

A propósito, expressões como «fosse onde fosse», «fosse qual fosse», etc., como se classificam?

São locuções pronominais indefinidas?

Obrigado.

Resposta:

Em princípio, a observação que faz está correcta. O advérbio onde pode ser antecedido por preposições que se aglutinam no caso de a (aonde) e de de (donde). Em princípio, segundo a norma, a preposição, quando pedida pelo verbo, deve anteceder o complemento, ou o advérbio. No caso em apreço, estamos perante o verbo ir, que rege a preposição a («Ir ao Brasil»). Deveria, pois, ou melhor, esperar-se-ia que o advérbio fosse antecedido pela preposição e adoptasse a forma aonde. Porém, por qualquer razão que não tenho como explicar, esta prática nunca foi generalizada no caso concreto da forma aonde. Sobre este assunto, dizem Cunha e Cintra, na Nova Gramática do Português Contemporâneo, p. 351:

«Embora a ponderável razão de maior clareza idiomática justifique o contraste que a disciplina gramatical procura estabelecer, na língua culta contemporânea, entre onde (= lugar em que) e aonde (= lugar a que), cumpre ressaltar que esta distinção, praticamente anulada na linguagem coloquial, já não era rigorosa nos clássicos.»

Em síntese, se quisermos ser totalmente rigorosos, diremos «fosse aonde fosse». Todavia, o uso condiciona-nos de tal forma, que, aqui e ali, mesmo estando conscientes da diferença entre onde e aonde, deixaremos cair, no nosso discurso, um onde em vez de aonde...

Pergunta:

Considero difícil, por vezes, classificar alguns nomes quanto à sua subclasse no que diz respeito aos concretos e abstractos. Assim sendo, gostaria que me esclarecessem o seguinte: os nomes área, manhã, rumor, buzinas (referindo-se ao som) e número são concretos, ou abstractos? Já os vi classificados das duas maneiras, o que me deixa um pouco confusa.

Grata pela atenção.

Resposta:

A dificuldade que refere é de todos nós, sobretudo porque nem sempre se pode delimitar o valor concreto ou abstracto de uma dada palavra. Se se diz dos nomes concretos que têm existência física, tangível, e dos abstractos que designam acções, qualidades, estados, noções e processos, nem sempre uma dada palavra se situa claramente num dos conceitos.

Vejamos, por exemplo, a palavra área. Designa algo tangível, mensurável, quando se reporta à superfície, por exemplo, de uma figura geométrica. Mas se contrapomos a área de ciências à de letras, a palavra assume um valor muito mais abstracto.

Rumor e som (das buzinas) são entidades audíveis, pertencem ao mundo sensível. Poderemos inseri-las nos nomes concretos, mas haverá situações em que essas mesmas palavras são usadas de forma mais abstracta do que noutras.

Também número poderá ocorrer em contextos mais ou menos abstractos. Em «o número dois é par» há maior concretude do que em «um grande número de pessoas manifestou-se em Lisboa».

Manhã é uma noção que pode ocorrer igualmente em contextos mais ou menos abstractos.

Sobre este assunto importa ter em conta que, embora se possa definir um conjunto de aspectos que permitem distinguir nomes concretos de nomes abstractos, esses mesmos aspectos permitem-nos identificar graus relativos de concretude e de abstracção em muitos nomes. O contexto é, muitas vezes, determinante na classificação de um nome como concreto ou como abstracto.

Por esta razão, considero que foi uma boa medida retirar este aspecto da

Pergunta:

Gostaria de ter mais informação sobre símbolos de revisão editorial. Haverá tabelas com os símbolos e respectivos significados em sítios web (em linha)? Caso não, poder-me-iam informar sobre bibliografia aconselhável? A segunda questão é sobre a "universalidade" do significado dos símbolos, uma vez que encontrei em sítios brasileiros símbolos diferentes dos mais usuais que conheço.

Obrigada desde já.

Resposta:

Não encontrei em linha muita informação específica sobre sinais de revisão. Encontrei duas listas de códigos, uma brasileira1, outra portuguesa2. Encontrei também o texto da Norma Portuguesa (NP 61, de 1987). A NP 61 é o documento mais extenso que conheço sobre códigos de revisão.

Além disso, em obras de estilo gráfico é possível encontrar breves referências ao tema, normalmente um quadro com os sinais mais comuns. É o que acontece, por exemplo, na obra de Álvaro F. Antunes, Manual de Estilo Gráfico, Edições CETOP, que, no capítulo dedicado à revisão, inclui, na página 94, um quadro com os símbolos usados na revisão. Também o Prontuário Ortográfico de Magnus Bergström e Neves Reis, da Editorial Notícias, inclui uma página com os símbolos mais comuns. Na edição que tenho, de 1999, fica na página 356.

Tanto quanto sei, embora haja alguns sinais iguais, ou semelhantes, não há uma verdadeira uniformização dos sinais de revisão. Pode mesmo acontecer que cada editora adapte e adopte um grupo de sinais que apresenta aos seus revisores de forma a uniformizar o trabalho interno. O mesmo acontece, creio, em projectos em linha que exigem proce...

Pergunta:

Venho por este meio solicitar a vossa colaboração para a definição e origem, caso seja possível, da expressão «deixar cair o tapete».

A expressão foi utilizada numa conversa, do seguinte modo: «não deixas cair o tapete». Devido ao contexto, entendi como elogio, mas fiquei curioso quanto ao significado.

Grato por toda a atenção que puderem dispensar, subscrevo-me com os melhores cumprimentos.

Resposta:

Não encontrei, nas obras consultadas, a expressão em apreço. Na Internet, encontrei-a uma única vez (cito com pequenos acertos):

«… as autarquias pela sua proximidade social devem compensar a distância do governo com políticas de regulação de atribuição de RSI, com políticas de promoção de emprego e de investimento, com políticas sociais radicais que evitem o “deixar cair ao tapete”.

«Para mim o Porto começa a “deixar cair o tapete”, dou-vos três sinais que me fizeram reflectir sobre isto:

«1.º Em S. Pedro/Azevedo de Campanhã (onde moro), nunca vi tanta gente a beneficiar de RSI com rendas pagas pela segurança social, a viver do Estado sem qualquer tipo de incentivo à procura de emprego ou à formação.»

Pelo contexto em que surge no excerto acima, creio que se poderá concluir que «deixar cair o tapete» significa «perder o controlo, exagerar». «Não deixar cair o tapete» será, seguindo esta interpretação, «não perder o controlo».

Pergunta:

Gostaria de saber como se pronuncia o plural e o feminino de corço; se é "Côrças" ou "córças" e se é "côrça" ou "córça", respectivamente.

Obrigado!

Resposta:

Os dois dicionários que nos dão informação sobre a pronúncia das palavras, Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa e Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, indicam para corço e corça a pronúncia "côrço" e "côrça", respectivamente. Não indicam qualquer alternância vocálica para o plural, pelo que presumo que a pronúncia "ô" se mantenha, tanto mais que, quando se regista essa alternância, ela ocorre também no feminino, o que não acontece na palavra em apreço.