Edite Prada - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Edite Prada
Edite Prada
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Edite Prada é consultora do Ciberdúvidas. Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, variante de Português/Francês, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa; mestrado interdisciplinar em Estudos Portugueses, defendido na Universidade Aberta de Lisboa. Autora de A Produção do Contraste no Português Europeu.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Um aluno está a escrever no quadro. O professor diz-lhe:

«O que está para aí a escrevinhar há tanto tempo?»

Como se deve classificar morfologicamente «para aí» neste contexto?

Resposta:

Do ponto de vista morfológico, à luz do Dicionário Terminológico, não há qualquer possibilidade de classificação do conjunto «para aí». No máximo, classificando individualmente cada uma das palavras, poderíamos dizer que são palavras invariáveis (B.2.2, flexão).

Considerando que as duas palavras se unem para construir sentido, do ponto de vista das classes de palavras, itens lexicais (B.3), diremos que se trata de uma locução.

A locução em apreço é classificada do ponto de vista discursivo, em C.1.1, Comunicação e interação discursivas, como marcador discursivo, mais propriamente como marcador conversacional ou fático (sublinhado meu, abaixo):

«C.1.1 – Marcadores discursivos

Unidades linguísticas invariáveis, com alto grau de gramaticalização, que não desempenham uma função sintáctica no âmbito da frase, nem contribuem para o sentido proposicional do discurso, mas que têm uma função relevante na produção dos actos pragmático-discursivos, estabelecendo conexões entre os enunciados, organizando-os em blocos, indicando o seu sentido argumentativo, introduzindo novos temas, mantendo e orientando o contacto do locutor com o interlocutor. Os marcadores discursivos podem subdividir-se em estruturadores da informação, sobretudo com a função de ordenação (“em primeiro lugar”, “por outro lado”, “por último”, etc.), de conectores (v.), de reformuladores, sobretudo com a função de explicação e de rectificação (“ou seja”, “por outras palavras”, “dizendo melhor”, “ou antes”, etc.), operadores discursivos, sobretudo com a função de reforç...

Pergunta:

Gostaria de saber quais são os fonemas da palavra pintainho e como se explica isso a crianças de 1.º ciclo.

Resposta:

Vale a pena ter em conta que uma coisa é o conhecimento que o professor precisa de ter acerca de um determinado assunto, outra coisa diferente é a forma como esse saber é transmitido aos alunos. Assim, para professor saber, diz-nos o Dicionário Terminológico (DT), em B.1.1, que um fonema é uma «Unidade mínima do sistema fonológico, que pode também designar-se como segmento. Dois sons que, substituídos um pelo outro no mesmo contexto, permitem distinguir significados são fonemas de uma língua. O /p/ de pata e o /b/ de bata são fonemas do português.»

No mesmo DT, mas no subdomínio E.1, «Representação gráfica, Letras acentos e diacríticos», podemos ver que letra é «Cada um dos sinais gráficos que constituem um alfabeto. A cada letra ou conjunto de letras pode corresponder um ou mais sons da língua...» e que dígrafo é «Grupo de duas letras que representa um único som».

Podemos dizer que um fonema é um som da língua portuguesa, no caso em apreço. Podemos ainda dizer que aos sons de uma língua corresponde, para a escrita, uma representação gráfica. Essa representação gráfica faz-se através do alfabeto e de alguns sinais auxiliares. Além disso, podemos dividir as letras do alfabeto em vogais e consoantes a que devemos acrescentar alguns dígrafos (nh, lh…), ou outros sinais, como acontece com a cedilha em ç.

Os fonemas da palavra pintainho são sete: /p/; /ĩ/; /t/; /ɐ/; /i/; /ɲ/; /u/. A consoante

Pergunta:

Poderemos considerar o verbo doer uma palavra derivada por sufixação?

Resposta:

No âmbito dos sufixos, importa distinguir os que são derivacionais, e que permitem a formação de novas palavras, dos flexionais, que permitem identificar e atribuir sentido às diferentes formas que uma palavra simples pode adotar.

Os sufixos – com maior rigor, afixos, uma vez que a vogal temática assume uma posição de interfixo e não de sufixo – que permitem identificar a forma do verbo doer como verbo no infinitivo são indicadores do tema do verbo, afixo, ou interfixo, -e-, e do modo infinitivo, afixo -r.

No caso de doer, não há, pelo menos não conheço, sufixos que constituam, a partir do verbo, outras palavras além das várias formas verbais, na sua flexão, mas se, em vez de nos restringirmos aos sufixos, pensarmos também em prefixos, temos uma palavra derivada em condoer, que é uma palavra nova, construída com a intervenção de um prefixo derivacional.

Em síntese, embora sejam identificáveis dois afixos em doer, tal facto não dá origem a uma palavra derivada, uma vez que se trata de afixos flexionais, sendo o verbo doer uma palavra simples.

Pergunta:

Gostaria de saber se rapariga é da família de palavras de rapaz e se bocejo é da família de palavras de boca.

Resposta:

No caso de bocejar, assumindo que tem como origem boquejar, a palavra pertence à família de boca.

O mesmo não se pode dizer de rapariga, cuja origem é apontada como obscura, não havendo uma relação clara entre a raiz desta palavra e a de rapaz.

Pergunta:

Sábado último vi, num canal qualquer de TV, uma mensagem publicitária do Ministério da Educação onde se anunciava estarem «em criação 20 novos campus universitários». Mais ou menos isto.

Ora, será que esse ministério desconhece o plural de campus?

Ou era apenas coerência com a nova política de não humilhar os brasileiros oriundos da educação pública ao invés de ensiná-los a usar corretamente a nossa língua? Vai ver que foi redação de algum "cumpanhêro".

«Estarem em criação...», ou «estar em criação...»? Alguma outra incorreção, se for o caso, no texto?

Resposta:

Plural de campus campi. Deveria ser «campi universitários».

Quanto ao comentário, ele foge ao objetivo do Ciberdúvidas.

«Estarem em criação» – o sujeito é «20 novos campus universitários», pelo que o plural do verbo se justifica e é adequado.