D´Silvas Filho - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
D´Silvas Filho
D´Silvas Filho
54K

D´Silvas Filho, pseudónimo literário de um docente aposentado do ensino superior, com prolongada actividade pedagógica, cargos em órgãos de gestão e categoria final de professor coordenador deste mesmo ensino. Autor, entre outros livros, do Prontuário Universal — Erros Corrigidos de Português. Consultor do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa.

 
Textos publicados pelo autor

D’Silvas Filho estabelece aqui o que (não) deve ser seguido na elaboração de um vocabulário ortográfico da língua portuguesa (VOLP), em Portugal, à luz das novas regras do Acordo Ortográfico (AO) de 1990. Críticas e recomendações ao que já foi publicado, neste ...

Pergunta:

No Acordo Ortográfico de 1990, na Base XIX, 1.º, lê-se:

«f) Nos axiónimos/axiônimos e hagiónimos/hagiônimos (opcionalmente, neste
caso, também com maiúscula): senhor doutor Joaquim da Silva, bacharel Mário
Abrantes, o Cardeal Bembo; santa Filomena (ou Santa Filomena).»

E com o clítico?

«Louvo a Deus; louvo-O.»

A maiúscula passa a ser facultativa?

Resposta:

Para os exemplos acima indicados: doutor, bacharel, cardeal, santa, nada no novo AO indica que na conjugação clítica o pronome possa ser escrito com maiúsculas. Deve escrever com minúsculas.

No novo AO não está explícito que as entidades sagradas (Deus, Mãe de Deus, etc.) devem ter inicial maiúscula. Penso, porém, que se deve respeitar a tradição religiosa; e também no pronome.

Assim, recomendo «Louvo a Deus; louvo-O».

Note que, no caso do inse{#c|}to louva-a-deus (grafado tudo em minúsculas, porque o hífen o permite), deverá obviamente escrever o pronome clítico também em minúsculas (ex.: «vejo-o»).

Ao seu dispor,

Pergunta:

Gostaria, se fosse possível, que as minhas dúvidas fossem esclarecidas pelo dr. D´Silvas Filho, cuja clareza de raciocínio e de expressão eu admiro profundamente.

Tenho algumas dúvidas que têm que ver com o discurso directo. Como devo pontuar as frases seguintes?

Exemplo 1:

— Que belo carro! — exclamou Pedro. — Gostava que fosse meu.

ou

— Que belo carro! — exclamou Pedro — Gostava que fosse meu.

Exemplo 2:

— Queres vir comigo? — perguntou Joana. — Não me demoro.

ou

— Queres vir comigo? — perguntou Joana — Não me demoro.

Estão bem pontuadas as seguintes frases?

— Eu não vou — afirmou João. — Estou farto.

— Ela dorme — afirmou Tânia —, mas ouve tudo.

Muito obrigada!

Resposta:

Agradeço a sua apreciação tão elogiosa. O meu objectivo, sempre, não é fazer literatura na escrita, mas transmitir a mensagem o mais claramente possível (lembro que, entre as qualidades clássicas da linguagem, está a clareza, além do respeito pelas regras...). Não se julgue, porém, que é fácil escrever simples e claro. Os textos têm de ser revistos várias vezes.

Miguel Torga, o mestre da perfeição literária na simplicidade (e bem teria merecido o Nobel), já dizia que escrever simples era difícil.

Se o escritor põe de parte a ideia de fazer uma peça literária, mas simplesmente deseja comungar sentimentos com o seu leitor, isso exige que se interrogue constantemente, introduzindo consigo, sem o escrever, a metalinguagem virtual: «há verosimilhança?», «percebem-me?», «entendem o que eu sinto?».

Quanto ao problema para que pede a minha opinião, eu escrevo:

— Que belo carro! — exclamou Pedro. — Gostava que fosse meu.

Justificação:

Neste discurso (directo) não há solução de continuidade discursiva entre a fala da personagem e a explicação do narrador com o declarativo; logo, minúsculas em «exclamou» (não proibidas depois de sinal de exclamação). O ponto final depois de «Pedro» pode significar que há uma pausa mais longa da primeira fala para a segunda (estas sempre antecedidas de travessão; os declarativos ou a acção interposta ficam, na fala, entre travessões, excepto no fim do parágrafo, que dispensa travessão). É costume mudar de parágrafo de interlocutor para interlocutor.

Também escrevo:

— Ela dorme... — afirmou Tânia — ..., mas ouve tudo.

Justificação:

A descrição do nar...

Pergunta:

Deparo-me com a seguinte dúvida: como se coloca por extenso um valor negativo?

Exemplo - 1 200,00€: «mil e duzentos euros negativos», ou «valor negativo de mil e duzentos euros» ou «menos mil e duzentos euros».

Muito obrigada.

Resposta:

A palavra menos induz a ideia de que estamos a subtrair uma quantidade a uma grandeza. Por exemplo, escrever: «menos mil e duzentos euros» deixa a ideia de que falta o diminuendo.

Um valor diz-se negativo quando expresso matematicamente por um número negativo: -1200 € é «o valor negativo de mil e duzentos euros.

Não gosto da expressão: «mil e duzentos euros negativos», pois há nela alguma incoerência lógico-conceptual: ninguém tem concretamente dinheiro negativo.

Ao seu dispor,

Pergunta:

Qual a diferença entre sinais auxiliares de escrita, sinais de pontuação e sinais de acentuação? Como classificamos o trema ou o til? São sinais auxiliares de escrita ou sinais de acentuação? Os sinais auxiliares de escrita não são unicamente os parênteses, as aspas, o asterisco e a chaveta? Se o acento circunflexo é um sinal de acentuação, então e o til e o trema? Como categorizamos? Não são sinais auxiliares?

Resposta:

Tradicionalmente, distinguem-se nos sinais gráficos:

Sinais ortográficos: acento agudo, acento circunflexo, acento grave, til, trema, cedilha, apóstrofo.

Sinais de pontuação: vírgula, ponto final, ponto-e-vírgula, dois-pontos, ponto de interrogação, ponto de exclamação, aspas e aspas altas (ou comas duplas), plicas (ou comas  simples), travessão, hífen, parênteses [curvos, angulares ou rectos (colchetes)], chave (ou chaveta), alínea, barra (direita e esquerda), asterisco, texto incompleto, parágrafo.

Segundo a TLEBS publicada em portaria, temos:

Acento gráfico: agudo, grave, circunflexo.
Notações léxicas: til, trema, cedilha.
Sinais de ligação: hífen, apóstrofo.
Sinais de pontuação: ponto final, ponto de interrogação, ponto de exclamação, dois-pontos, ponto-e-vírgula, vírgula, reticências, travessão.    
Sinais auxiliares de escrita: parênteses (rectos e curvos), aspas e aspas altas, asterisco, chaveta.
Configuração gráfica: alínea, parágrafo, espaço (linhas, palavras, letras), margem (superior, inferior, lateral).

NOTAS:

A TLEBS (Terminologia Linguística para o Ensino Básico e Secundário de Portugal), concebida por ilustres linguistas, depois duma demorada e elaborada gestação, foi oficializada para entrar em vigor, com numerosas e dedicadas formações. Tinha, porém, um defeito básico no seu título: parecia destinar-se na totalidade aos ensinos indicados. Isto, porque incluía também termos usados na moderna investigação científica, do ensino superior, o que pôs em polvorosa quem pensou que tudo aquilo s...