Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual é a etimologia das palavras atlântico, jónico, mar, mediterrâneo e oceano?

Obrigado!

Resposta:

atlântico

Deriva de Atlas, que na mitologia grega era o deus que sustinha as colunas do mundo e detinha o oceano. Em grego, o substantivo era Átlas, Atlantos, que se adaptou ao latim como Atlas, Atlantis, do qual se formou o adjectivo que é hoje Atlântico. Hoje, Atlas é também o nome da cadeia montanhosa que se estende ao longo do Norte de África, de Marrocos, a oeste, à Tunísia, a este, passando pela Argélia.

jónico

Costuma ser atributo de parte do Mediterrâneo, o mar Jónico, limitado a este pelas costa da Grécia e a oeste pelas do Sul da Itália. O nome relaciona-se com o do povo grego, os Jónios, que habitava zonas da Grécia (Ática e norte do Peloponeso) e o litoral da Ásia Menor (actual Turquia). Este nome parece ser pré-helénico e talvez se relacione com o sânscrito yoni, «útero, vulva», fazendo alusão a um povo adorador de uma divindade feminina (ver ionian em Online English Etymology).

mar

É palavra de origem latina, mar, maris. Este vocábulo remonta à raiz indo-europeia *mori-, «laguna», que está presente em línguas de outras subfamílias indo-europeias: alemão Meer, «lago»; russo more; irlandês muir.

ver Ernesto d´Andrade, Histórias de Palavras. Do Indo-Europeu ao Português, Lisboa, A. S...

Pergunta:

Diz-se «eu acolcheto», ou «eu acolchEtu» (E = aberto)?

Resposta:

A pronúncia mais correcta é com e aberto (é), tal como em interpreto, aperto ou começo. Os verbos da 1.ª conjugação com o ou e no radical (mor- de morar e começ- de começar), abrem estas vogais quando estas se tornam tónicas  nas 1.ª,  2.ª e 3.ª  pessoas do singular e na 3.ª do plural  do presente do indicativo:  morar  — moro, moras, mora, moram; começarcomeço, começas, começa, começam.1


1 Em português europeu, seguido de -ch-, o e do radical dos verbos da 1.ª conjugação pode também ser pronunciado como [ɐ] ou [ɐj]: f[ɐ(j)]cho, f[ɐ(j)]chas, f[ɐ(j)]cha, f[ɐ(j)]cham. Se a referida vogal se encontrar antes de -j- (desejar, farejar), pronuncia-se [e] (é fechado), [ɐ] ou [ɐj]: des[e]jo/des[ɐ(j)]ja, des[e]jas/des[ɐ(j)]jas, etc. Ainda em Portugal, antes de -nh- e -lh

Pergunta:

Uma pergunta muito simples: azeitona e oliva são sinónimos?

Obrigado.

Resposta:

São. Azeitona é o termo mais corrente em português e tem origem árabe (az-zaytūna). Contudo, existe o termo de origem latina oliva, que, pela sua configuração, indicia influência culta (da Igreja, na Idade Média ou de círculos eruditos, mais tarde, no Renascimento). Note-se que em português há pares de vocábulos constituídos por um termo de origem latina e outro de origem árabe que são semanticamente próximos ou equivalentes; por exemplo: lat. soro (do leite) vs. ár. almece; lat. segar vs. ár. ceifar.

Pergunta:

Escrevo "ocularcentrismo", ou "ocular-centrismo"? Um filósofo escreve "falogocêntrico", o que está correcto. Poder-se-ia escrever "falogocularcêntrico" (conceito composto dos outros dois)?

Resposta:

Falogocêntrico é o adjectivo correspondente ao substantivo falogocentrismo. Segundo o E-Dicionário de Termos Literários, o termo foi «cunhado por Jacques Derrida combinando as palavras falocentrismo e logocentrismo para produzir uma crítica às teses de Jacques Lacan no célebre seminário  sobre o conto de Edgar Alan Poe The Purloined Letter».

Trata-se, portanto, de uma amálgama que parece associar as noções dos termos amalgamados, que se encontram registados no Dicionário Houaiss: falocentrismo, «doutrina ou crença centrada no falo, especialmente na convicção da superioridade do sexo masculino»; e logocentrismo, palavra que também ganhou uso com o filósofo Derrida (1930-2003), para designar a «centralidade do logos1 no pensamento ocidental, questionável em decorrência do seu caráter metafísico, fruto de uma consciência interiorizada que se expressa especialmente através da linguagem falada e empreende uma investigação ontológica da realidade».

Ainda sobre falogocentrismo, o E-Dicionário de Termos Literários esclarece que é termo usado na crítica feminista para denotar «a dominação masculina, evidente no facto de o falo ser sempre aceite como o único ponto de referência, o único modo de validação da realidade cultural».

Em relação ao composto formado por ocular e centrismo, em princípio, são estranhas as formas apresentadas pelo consulente, porque a noção de «perspectiva centrada nos olhos ou no ol...

Pergunta:

Quero saber o significado desta palavra que encontrei num texto de Raul Brandão: «o ano não foi cadible

Resposta:

José Pedro Machado, no Grande Dicionário da Língua Portuguesa, classifica cadible como adjectivo dos dois géneros e atribui-lhe os significados de «bom, propício». Desconheço a origem desta palavra, que não encontro registada noutros dicionários.