Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Uma pergunta muito simples: azeitona e oliva são sinónimos?

Obrigado.

Resposta:

São. Azeitona é o termo mais corrente em português e tem origem árabe (az-zaytūna). Contudo, existe o termo de origem latina oliva, que, pela sua configuração, indicia influência culta (da Igreja, na Idade Média ou de círculos eruditos, mais tarde, no Renascimento). Note-se que em português há pares de vocábulos constituídos por um termo de origem latina e outro de origem árabe que são semanticamente próximos ou equivalentes; por exemplo: lat. soro (do leite) vs. ár. almece; lat. segar vs. ár. ceifar.

Pergunta:

Escrevo "ocularcentrismo", ou "ocular-centrismo"? Um filósofo escreve "falogocêntrico", o que está correcto. Poder-se-ia escrever "falogocularcêntrico" (conceito composto dos outros dois)?

Resposta:

Falogocêntrico é o adjectivo correspondente ao substantivo falogocentrismo. Segundo o E-Dicionário de Termos Literários, o termo foi «cunhado por Jacques Derrida combinando as palavras falocentrismo e logocentrismo para produzir uma crítica às teses de Jacques Lacan no célebre seminário  sobre o conto de Edgar Alan Poe The Purloined Letter».

Trata-se, portanto, de uma amálgama que parece associar as noções dos termos amalgamados, que se encontram registados no Dicionário Houaiss: falocentrismo, «doutrina ou crença centrada no falo, especialmente na convicção da superioridade do sexo masculino»; e logocentrismo, palavra que também ganhou uso com o filósofo Derrida (1930-2003), para designar a «centralidade do logos1 no pensamento ocidental, questionável em decorrência do seu caráter metafísico, fruto de uma consciência interiorizada que se expressa especialmente através da linguagem falada e empreende uma investigação ontológica da realidade».

Ainda sobre falogocentrismo, o E-Dicionário de Termos Literários esclarece que é termo usado na crítica feminista para denotar «a dominação masculina, evidente no facto de o falo ser sempre aceite como o único ponto de referência, o único modo de validação da realidade cultural».

Em relação ao composto formado por ocular e centrismo, em princípio, são estranhas as formas apresentadas pelo consulente, porque a noção de «perspectiva centrada nos olhos ou no ol...

Pergunta:

Quero saber o significado desta palavra que encontrei num texto de Raul Brandão: «o ano não foi cadible

Resposta:

José Pedro Machado, no Grande Dicionário da Língua Portuguesa, classifica cadible como adjectivo dos dois géneros e atribui-lhe os significados de «bom, propício». Desconheço a origem desta palavra, que não encontro registada noutros dicionários.

Pergunta:

Observo que a dúvida quanto a pronúncia da língua portuguesa atinge quase a totalidade dos falantes. Os esclarecimentos a respeito do assunto deixam a desejar, uma vez que informam apenas a pronúncia de cada região. Porém, o que todos desejam saber é a pronúncia correta da palavra.

Resposta:

Não conheço dicionários brasileiros que contenham a transcrição fonética das palavras. Esta, num dicionário geral, requer realmente a estabilidade das formas linguísticas inventariadas, não sendo prático dar conta de toda a gama de formas em variação. Mesmo assim, em Portugal, existem neste momento dois dicionários que apresentam transcrição fonética; por exemplo:

a) o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa, indica a pronúncia-padrão europeia, que é , cada vez mais, a dos falantes cultos e/ou influentes do dialecto de Lisboa;

b)o Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, tem transcrições que, não se afastando muito da pronúncia-padrão, deixam margem para alguma variação, com a representação de pronúncias em alternativa ou de aspectos fónicos característicos dos dialectos setentrionais portugueses como seja a manutenção do ditongo [ow] (o[w]ro).

Calculo que, no Brasil, apesar da grande e prestigiada tradição lexicográfica existente, parece não se ter chegado a um consenso sobre qual a pronúncia-padrão do português brasileiro. Daí a falta de transcrições fonéticas completas que descrevam a pronúncia de cada item lexical na variedade brasileira do português. São, pois, de compreender as observações e a queixa da consulente.1

1 Segundo D´Silvas filho (informação pessoal) o novo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras trará a pronúncia dos vocábulos.

Pergunta:

O meu nome é Liliana Ferreira, eu gostaria de saber a origem do sobrenome Cantarinho, que é um nome português, e a família que o tem é de origem alentejana.

Aguardo resposta, muito obrigada.

Resposta:

José Pedro Machado (Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa) regista Cantarinho apenas como topónimo de Avis (Portugal) e Rondónia (Brasil). Existe também Cantarinhos como nome de povoação nas regiões portuguesas da Chamusca, de Portalegre e de Vila Verde. A pergunta da consulente indica, portanto, que o topónimo Cantarinho é também usado como apelido.

Observe-se que Machado assinala também Cantarinha quer como topónimo quer como apelido derivado de uma antiga alcunha. Seja como for, Cantarinho e Cantarinha são diminutivos, respectivamente, dos substantivos comuns, cântaro e cântara. Em conclusão, o nome Cantarinho tanto pode ter origem em nome de povoação como ser uma antiga alcunha.