Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Em inglês existe o verbo tantalise, de Tantalus, bem como os substantivos tantalisation e tantaliser (ou com zz pelos ss nos EUA), que segundo o Dictionary.com significa aproximadamente «atormentar com a visão de algo desejado mas inalcançável; provocar suscitando expectativas que são repetidamente desapontadas» (tradução minha).

De acordo com a Infopédia e a Wikipédia, Tântalo seria na mitologia grega o rei da Frígia, região do Noroeste da Ásia Menor, lançado ao Tártaro, o inferno grego, e condenado ao suplício da sede perpétua («suplício de Tântalo»: «sofrimento causado por coisa ardentemente desejada, e que parece prestes a obter-se, mas que escapa sempre»). Este castigo consistia na impossibilidade de Tântalo saciar a sua sede e a sua fome por as águas escoarem e os ramos das árvores de fruto se afastarem com o vento sempre que tentava chegar-lhes.

Pelo que pesquisei, em português dispomos apenas dos substantivos tântalo ou tantálio (elemento químico cujo nome tem a origem sobredita) e do adjectivo relacionado tantálico.

Posto isto, gostaria de saber a vossa opinião sobre a formação e utilização eventuais de "tantalizar", "tantalização", "tantalizador", "tantalizante" e "tantálico", ou outros, com o mesmo sentido que os falantes do inglês dão aos vocábulos equivalentes na sua língua.

Muito obrigado e as minhas perpétuas congratulações pelo vosso tão útil serviço.

Resposta:

As formas tântalo e a sua variante tantálio estão registadas no Dicionário de Língua Portuguesa da Porto Editora (disponível na Infopédia). Todas as outras formas referidas — tantalizar, tantalização, tantalizador, tantalizante e tantálico — são legítimas e estão consignadas no Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa.

Pergunta:

Informar o significado e o conceito do termo "taylor made".

Resposta:

A expressão inglesa tailor-made1 significa o mesmo que «feito por medida» em português europeu, ou «feito sob medida», em português brasileiro (ver The Oxford Portuguese Dictionary).

1 Este termo tem hífen. Além disso, tailor, «alfaiate», escreve-se com i e não com y; o {#apelido|sobrenome} Taylor é que tem y (cf. Behind the Name).

Pergunta:

No artigo da Wikipédia sobre Minas Gerais, leio o seguinte:

«Vários edifícios de importância histórica foram tombados.»

Que significa tombar nesta frase?

Resposta:

É um verbo formado por conversão de tombo, «inventário dos bens de raiz com todas as demarcações» e «registro ou relação de coisas ou fatos referentes a uma especialidade, a uma região etc.» (Dicionário Houaiss).

Tem duas acepções, de acordo com o Dicionário Houaiss:

1. «fazer o tombo de; arrolar, inventariar, registrar. Ex.: <t. os bens de uma herança> <t. os livros de um cartório>

2. (regionalismo brasileiro) «colocar (o governo) sob sua guarda (bens imóveis e/ou móveis que, sendo de interesse público por seu valor histórico, arqueológico, etnográfico, artístico, paisagístico etc., devem ser conservados e protegidos pelo Estado)»

Pergunta:

«Estreou nos cinemas mais um filme de vampiro.»

Na frase acima, «um» é artigo indefinido, ou numeral?

Informo que, antes de encaminhar a pergunta, verifiquei a esta resposta. Como em muitas situações na língua portuguesa, frases diferentes levam a análises diversas, e mesmo na resposta referida se menciona a possibilidade de duas análises («Convém, no entanto, acrescentar que a classificação de um como numeral não é impossível nas expressões "um terramoto" e "um acidente de viação", desde que devidamente contextualizado...), insisto em que, se for possível, se analise a frase por mim enviada (a propósito, tudo indica tratar-se de numeral, mas gostaria de uma confirmação).

Obrigado.

Resposta:

Considero que um é ambíguo no contexto em causa. Duas leituras são possíveis:

(1) «Estreou(-se)1 nos cinemas mais um filme de vampiro.» = «Estreou nos cinemas um filme de vampiro que se soma ao conjunto já existente de filmes de vampiro.»

(2) «Estreou(-se) nos cinemas mais um filme de vampiro.» = «Estreou nos cinemas um filme de vampiro que não identifico (não digo qual é o título, quem é o realizador, quem são os actores, etc.) e que se soma a outros já existentes.»

Em (1), interpreto «um» como um numeral, enquanto em (2) o que faço é atribuir a «um filme de vampiro» uma leitura específica, que decorre de o discurso estabelecer um referente que é uma parte singular não identificada de um conjunto considerado como «filmes de vampiro» (ver Maria Helena Mira Mateus et al. Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Editorial Caminho, 2003, págs. 224/225). Note que posso adaptar (1) substituindo a palavra um por outros numerais:

(1)´ «Estrearam(-se) nos cinemas mais três filmes de vampiro.»

A leitura proposta em (2), por seu lado, permite a pluralização de um (ver Mateus, op. cit., pág. 228/229):

(2)´ «Estrearam(-se) nos cinemas mais uns filmes de vampiro.»

Esta frase pode também reescrever-se sem determinante explícito, mantendo a leitura específica:

(2)´´«Estrearam(-se) nos cinemas mais filmes de vampiro.»

1 Como intransitivo e no sentido de «exibir-se pela primeira vez», usa-se estrear-se e

Pergunta:

Gostaria de saber se, quando, numa frase, nos referimos a uma empresa ou a um ministério especifico, deveremos usar minúsculas ou maiúsculas.

Exemplo:

«A CP fez uma alteração aos seus horários. Segundo a Empresa, o motivo foi…»

Resposta:

Não no caso que apresenta, porque, na frase, o uso da terceira pessoa sugere que o contexto tem função informativa. Além disso, emprega-se empresa como mera estratégia de referência textual para evitar repetir «CP».

No entanto, é possível que na troca de correspondência se escreva «Empresa» com maiúscula por uma questão de deferência; por exemplo:

«Exmos. Senhores,

Tendo conhecimento de que a CP decidiu alterar os seus horários, gostaria de apresentar algumas sugestões que muito contribuirão, estou certo, para uma melhor relação da Empresa com os utentes...»

Neste caso, também se pretende evitar repetir CP, através de «a Empresa», mas a maiúscula é sinal de cortesia.