Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

O que são sufixos de adjectivalização? Para que servem? Podem dar exemplos?

Resposta:

Se consultar a Gramática da Língua Portuguesa (Lisboa, Editorial Caminho), de Maria Helena Mira Mateus et al., verá que entre os afixos derivacionais se encontram os sufixos de adjectivalização, que são aqueles que, seleccionando bases adjectivais, nominais ou verbais, permitem formar adjectivos (págs. 944/945).

Os sufixos de adjectivalização podem, portanto, ser (ver ibidem):

a) deajectivais (base adjectival): patern[al], conform[ista];

b) denominais (base nominal): científ[ico], rug[oso], fenomen[al];

c) deverbais (base verbal): lavá[vel], domina[dor], chama[tivo], tolera[nte].

Pergunta:

Em referência à dúvida 25 839, a qual se publicou com o título "Nascer e a voz passiva + maiúsculas iniciais", eu agradecia imenso, se me pudessem dizer algo ao seguinte:

Também eu assisti à discussão, à qual a senhora Isabel Maria Lopes se refere.

O autor desta frase afirma que, conjugando o verbo nascer no particípio passado, o verbo torna-se nascido. E assim, construindo uma frase no particípio passado, talvez a frase esteja correcta.

Verificando na Internet, se o autor realmente tinha razão com a sua afirmação, eu encontrei o oposto à resposta do senhor Carlos Rocha, na qual este menciona que, «em português, não se diz "ser nascido" mas simplesmente nascer, ou seja, este verbo não tem voz passiva».: poemas, canções e textos de escritores onde se usa exactamente esta forma do verbo nascer.

Por exemplo:

Grupo/Cantor: Tonico e Tinoco

Canção: Peão Vaqueiro

Autor(es): Tonico

«Eu fui nascido no campo

Fui criado na emboscada

Eu nasci pra sê peão

Serviço que mais me agrada

Eu sô campero garboso

So lidano côa boiada

Vivo no lombo de burro

Nos recantos das estradas»

Grupo...

Resposta:

1. «Fui nascido»

Na resposta em causa, interpretei a sequência fui nascido à luz da possibilidade de se tratar de uma construção passiva, que não é compatível com verbos do tipo que abrange nascer (verbos inacusativos). Acrescento agora que a fui nascido só é possível em português contemporâneo como arcaísmo, isto é, como expressão representativa de fases anteriores da história da língua prestes a cair em em desuso. Mas aí, note-se, a forma fui (3.º pessoa do singular do presente do indicativo do verbo ser) é um auxiliar não da passiva mas do antigo pretérito perfeito composto de nascer. Com efeito, lemos na Gramática da Língua Portuguesa (Lisboa, Editorial Caminho), de Maria Helena Mira Mateus et al. (págs. 513/514):

«[...] no português antigo, era seleccionado o verbo se(e)r como auxiliar dos tempos compostos com verbos inacusativos [...]:

(15) (a) — O meu filho he morto. Ven e resuscita-o.
       (b) Quand´eu um dia fui en Compostela
            en romaria, via ua pastor
            que, pois fui nado, nunca vi tan bela.
       (c) Idas som as frores
            d´aqui bem com meus amores!

Ainda sobrevivem exemplos desta sintaxe antiga em expressões como Era chegada a ocasião tão esperada. Serão passados três anos antes que se reencontrem, de sabor arcaizante.»

Pergunta:

Nome de «terra que se pode cultivar»?

Nome de «ser que vive fora de terra»?

Resposta:

Se está pedir os substantivos correspondentes a «terra que se pode cultivar» e «ser que vive fora de terra», existe para o primeiro caso, terreno, que, entre outras acepções, tem a de «porção de terra própria para o cultivo». No segundo caso, as possibilidades são muitas, porque há diferentes espécies de seres animais e vegetais que vivem fora de terra, por exemplo, no mar, sem termo genérico que as refira. Repare que a pergunta, como está formulada, sugere que pretende termos que se aplicam a tais seres no contexto da oposição terra/mar, ou seja, meio terrestre vs. meio aquático.1 Se o que pretende é afinal a palavra que se refere a «ser que vive fora da Terra (planeta)», a resposta é muito mais fácil: extraterrestre ou extraterreno.

1 Não conheço animal que viva permanentemente no ar.

Pergunta:

Gostaria de conhecer o significado do seguinte prenome: Iaponira.

Resposta:

Apenas posso registar aqui este curioso nome sem outra informação, porque não o encontro sequer atestado em inventários de nomes, impressos ou em linha.

Pergunta:

Gostaria que me esclarecessem sobre o que é uma frase fonética.

Obrigada.

Resposta:

O mais próximo que descubro de «frase fonética» é o conceito de «fonética de frase», tal como foi formulado pelo linguista brasileiro Mattoso Câmara, apoiado numa perspectiva estruturalista. Um estudo refere-se assim a esse domínio de análise:

«Também a assim chamada Fonética Sintática ou da Frase, outro tipo de pesquisa mencionado por Mattoso nesse contexto, estuda as mudanças condicionadas pelo papel ou pela posição das palavras dentro de um enunciado maior (a frase), tais como os fenômenos da acentuação e do sandhi. O termo sandhi significa juntura, ou seja, as pausas vistas como demarcadoras de grupos fônicos, sintagmas, vocábulos, frases e é usado na Morfologia e na Sintaxe para indicar modificações fonológicas de formas gramaticais que ficaram justapostas (Câmara Jr., 1954). O objetivo, de acordo com Mattoso (1939 LLG II:183), é

Estudar os casos em que os fonemas, iniciais e finais de um vocábulo formal, sofrem modificações inesperadas, porque o vocábulo, em muitas ocorrências da prática, se apresenta integrado num vocábulo fonético maior; cf. nem na expressão nem ela, onde temos foneticamente ne-nhe-la.»

O termo frase fonética designa, pois, uma entidade de maior extensão que a palavra e na qual existem fenómenos específicos como o da ligação entre palavras e o das variantes posicionais (ver também Enciclopédia Verbo Luso-Brasileira de Cultura, s. v. fonética, artigo da autoria de Brian F. Head).