Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Desejo o vosso esclarecimento sobre o modo correto de escrever na atual grafia portuguesa os seguintes prenomes: Alcíone/Alcione (paroxítona), Aloísio/Aluísio, Boaventura, Deocleciano/Diocleciano, Dourival/Dorival, Eloísa/Heloísa, Lourival/Lorival, Sólon/Solon (agudo).

Resposta:

Um esclarecimento prévio: apoio-me no Vocabulário da Língua Portuguesa (1966), de Rebelo Gonçalves, que fixa a grafia das palavras em consonância com o Acordo Ortográfico de 1945, porque verifico que os vocabulários ortográficos da língua portuguesa da Academia Brasileira de Letras não incluem nomes próprios. Deste modo, as formas correctas, pelo menos, em Portugal, são:

Alcíone
Aloísio
Boaventura
Diocleciano
Heloísa
Sólon

Sobre os nomes Dourival/Dorival e Lourival/Lorival não há registo na fonte consultada, porque são pouco ou nada frequentes na tradição onomástica de Portugal. Consultei obras brasileiras que, no entanto, não têm o aval da Academia Brasileira de Letras. Sendo assim, é difícil saber exactamente qual a etimologia destes antropónimos. O Vocabulário Ortográfico de Nomes Próprios, de Artur de Almeida Tôrres e Zélio dos Santos Jota (Rio de Janeiro, Editora Fundo de Cultura, 1961), regista apenas as formas com o: Dorival e Lorival. Já o Dicionário Etimológico de Nomes e Sobrenomes, de Rosário Farâni Mansur Guérios (São Paulo, Editora Ave Maria, 1973), deixa por determinar a origem destes antropónimos, da qual dependeria a respectiva ortografia, e aceita as duas variantes Dorival/Dourival, enquanto consigna só a forma Lourival.1

Em conclusão, nenhum dos nomes apresentados se vê alterado pelo Acordo Ortográfico de 1990. Calculo, portanto, que o consulente, quando diz «atual grafia portuguesa», se refira aos códigos ortográficos que prevaleceram, a partir da década de 40, nos territórios onde se fala (e escreve) português, ou seja, o Formulári...

Pergunta:

Deve dizer-se estar «de férias», ou estar «em férias»?

 

Resposta:

Com os verbos estar, ir, entrar, é mais corrente usar-se a locução «de férias» (cf. dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, s. v. férias, e Dicionário Estrutural, Estilístico e Sintáctico da Língua Portuguesa). Isto não quer dizer que a expressão «em férias» esteja incorrecta: na realidade, em certos contextos, pode permutar com «de férias» sem que haja erro ou diferença de significado assinalável («encontrei-o de férias/em férias no Algarve»).

Pergunta:

Com as mudanças de regras em nossa língua, gostaria de saber como fica interárea, como no exemplo:

«Relacionamento interárea.»

Obrigada.

Resposta:

Não há alteração: interárea.

Depois de inter-, que termina em consoante, usa-se hífen apenas se o elemento de constituição de palavra que se segue a este prefixo começar por h-: inter-helénico, inter-hemisférico, inter-humano (cf. Dicionário Houaiss e n.º 1 da Base XVI do Acordo Ortográfico de 1990).

Pergunta:

Gostaria que me esclarecessem os conceitos regionalismo e dialecto. Regionalismo é só as expressões (léxico) características de determinadas regiões do país ou também as diferenças fonéticas. Quando é que devo utilizar o termo regionalismo e o termo dialecto? (Já consultei respostas aqui no Ciberdúvidas, mas não consegui ficar esclarecida.)

Obrigada!

Resposta:

O termo regionalismo costuma aplicar-se apenas a unidades lexicais, como se depreende da definição contida no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa:

«Vocábulo, acepção, expressão própria de uma região. Cimbalino é um regionalismo do Porto que signifca café

Que a propósito de regionalismo, se fale também da pronúncia, compreende-se, porque a ocorrência de um som diferente do que a norma prevê em determinada posição de palavra pode levar muitas pessoas a concluir apressadamente, por exemplo, que "baca" não é o mesmo que vaca ou que "manêra" não é variante de maneira, quando ambos os casos são exemplos de variação fonética e não lexical.

Quanto a dialecto, temos várias respostas em arquivo, mas vale a pena transcrever a definição proposta pelo dicionário em referência:

«Variedade local ou regional de uma língua que apresenta particularidades fonéticas e, eventualmente, lexicais ou outras.»

Não se deve, portanto, confundir o termo regionalismo com dialecto: este é uma variedade linguística, com características fonéticas, morfológicas, sintácticas, lexicais e semânticas próprias; aquele aplica-se à palavra ou às palavras que caracterizam determinado dialecto.

Pergunta:

Sobre a lenda gaúcha, o correto é «Negrinho do Pastoreio», ou do «Pastoreiro»?

Resposta:

A forma correcta desse nome é «Negrinho do Pastoreio» ou «Negrinho do Pastorejo». Trata-se de uma locução nominal registada pelo Dicionário Houaiss como regionalismo do Rio Grande do Sul e que designa «[um] ser imaginário que protege e ajuda pessoas do campo, esp[ecialmente] crianças, na busca de algo que foi perdido]». As expressões «Crioulinho (ou Crioulo) do Pastoreio» ou «do Pastorejo» têm uso equivalente. Em todas estas designações, usam-se maiúsculas iniciais quando se refere a personagem em apreço como protagonista da lenda que a popularizou.

Diz-se «do pastoreio» ou «do pastorejo», porque a principal ocupação desta figura lendária era o pastoreio ou pastorejo, «ofício de pastor» (ibidem).