Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria de saber em que grau se encontra o adjectivo extraordinário numa frase como a seguinte: «A moradia era extraordinária.» Será o grau normal, ou o superlativo absoluto?

Resposta:

Trata-se de um adjectivo no grau normal, porque extraordinário se fixou no português como unidade autónoma em relação a ordinário; por outras palavras, extraordinário não significa «muito ordinário», mas sim «fora do vulgar». Outra coisa é referir o valor de intensidade associado ao adjectivo, o qual de facto é sinónimo de formas de superlativo do adjectivo bom, como «muito bom» e óptimo. Mas, repita-se, isso não significa que extraordinário seja uma forma de superlativo.

Pergunta:

Provavelmente devido à idade avançada adapto-me mal a modernos usos de linguagem. Já foi o caso do "dia solarengo" em vez de "soalheiro", agora, se alguém me diz estar num ambiente "solarengo", eu não sei se está na praia ou num solar... Deixa pra lá!... Hoje, passados os incêndios, descobri porque é tão difícil apagar fogos florestais!... É que em vez de "heli-tanques" ou "aero-tanques" enviam "bombardeiros"!?... Solicito a vossa opinião quanto a esta nova evolução, muito dinâmica, em uso por toda a comunicação social...

Muito agradecido.

Resposta:

Em Portugal, o termo bombardeiro1 está de facto a utilizar-se em referência aeronaves usadas no combate de incêndios florestais, mas o termo fixado pelo glossário da Autoridade Nacional de Protecção Civil é aerotanque (sem hífen), que tem três termos subordinados relativos a tipos de aerotanque assim definidos:

«AEROTANQUE

Ligeiro (AETL) Meio aéreo (avião) para missões de combate a incêndio. Transporta entre 1800 e 2800 lts de produto de extinção. O abastecimento do produto de extinção é feito em terra.

Médio (AETM) Meio aéreo (avião) para missões de combate a incêndio. Transporta entre 2800 e 4000 lts de produto de extinção. O abastecimento do produto de extinção é feito em terra.

Pesado (AETP) Meio aéreo (avião) para missões de combate a incêndio. Transporta acima de 4000 lts de produto de extinção. O abastecimento do produto de extinção pode ser efectuado no mar, barragens, albufeiras, rios ou em terra.»

1 Bombardeiro, referido a aeronave, continua a significar «avião de grande porte que lança bombas» (ver Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, disponível na Infopédia).

Pergunta:

É aceitável a grafia «Alex-o-Magnata»?

Obrigado.

Resposta:

Não. Deve escrever-se «Alex, o Magnata», como se escreve «Alexandre, o Grande», «Plínio, o Antigo» ou «Frederico II, o Grande» (cf. Dicionário Prático Ilustrado, Porto, Lello e Irmãos Editores, 1959), sem hífen, mas com vírgula, porque a expressão antecedida de artigo é um cognome, o qual, do ponto de vista sintáctico, equivale a um aposto.1

1 No Dicionário Houaiss, escreve-se «Alexandre o Grande» na definição de helenístico. No entanto, como «o Grande» não deixa de ter função de aposto, parece-me mais adequado o uso de vírgula antes dessa expressão.

Pergunta:

Como se classificam as seguintes palavras quanto à sua formação?

Pluriforme, autógrafo e maremoto.

Resposta:

Trata-de de compostos eruditos, também chamados compostos morfológicos (ver Dicionário Terminológico):

pluriforme: palavra de origem latina formada pelos elementos pluri-, «do lat. plus, plūris, "mais, maior"», e -forme, «já presente em adj. latinos em -formis» (Dicionário Houaiss);

autógrafo: palavra erudita formada pelos elementos de composição de origem grega auto-, «do gr. autós, ê, ó "(eu) mesmo, (tu) mesmo, (ele) mesmo, (si) mesmo", e -grafo, «do gr. graphê, ês, "escrita, escrito, convenção, documento, descrição"» (idem);

maremoto: «mar sob a f[orma] lat[ina] mare + el[emento] -moto (< lat. motus, us "movimento, agitação, abalo"), p[or] ana[logia] a terremoto».

Pergunta:

No âmbito das comemorações do centenário da República, a RTP exibiu um programa que intitulou de Vivá República.

Ora, considerando a existência de uma crase em "Vivá" de "Viva a República", não deveria escrever-se "Vivà República"?

Obrigado.

Resposta:

Teria sido efectivamente preferível escrever «Vivà República», porque, como diz o consulente, a representação gráfica de um a aberto resultante da crase de dois aa em sílabas átonas é à. É o que mostram, por exemplo, as contracçôes prà e prò, respectivamente, «para a» e «para o», as quais, em português europeu, se usam apenas no registo do discurso informal.

CfA implantação da República