Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual a etimologia e a ortografia correcta de uma das designações de haxixe, "xamon"/"chamon"? E a terminação em n é lícita?

Resposta:

Não dispomos de fontes que esclareçam a etimologia desta palavra usada em Portugal. Encontramos o seu registo no Novo Dicionário do Calão (Casa das Letras, 2005), de Afonso Praça, com a grafia "chamon" e definida como sinónimo de haxixe. No entanto, o sítio eletrónico TeamNet, alojado nas páginas do Instituto Camões, inclui a forma chamom, como termo informal, equivalente a haxixe. Não havendo informação etimológica que possa pôr em causa esta grafia, parece ser esta a forma aconselhável, uma vez que não existem palavras agudas grafadas com n final em português.

Pergunta:

«Ele opôs-se à mudança de sala.»

«Ele opôs-se à Maria.»

«À mudança de sala» e «à Maria» são complementos indiretos?

Resposta:

O verbo opor-se completa-se, nas duas frases em apreço, de formas distintas.

Repito e numero os exemplos:

1. «Ele opôs-se à mudança de sala.»

2. «Ele opôs-se à Maria.»

Enquanto em 1 não é possível substituir «à mudança de sala» pelo pronome pessoal lhe, como se pode verificar pela não aceitabilidade de 1.1, em 2 podemos substituir «à Maria» por lhe, como se pode verificar em 2.1 (o * indica agramaticalidade):

1.1. *«Ele opôs-se-lhe» (lhe = à mudança de sala).

2.1. «Ele opôs-se-lhe» (lhe = à Maria).

Por outro lado, se, em vez do pronome pessoal dativo (lhe), optarmos por utilizar o pronome tónico antecedido de preposição, continuamos a verificar a não aceitabilidade dessa construção para a frase 1, como se pode verificar em 1.2, contrariamente a 2, em que essa substituição é aceitável, como se regista em 2.2:

1.2. *«Ele opôs-se a ela» (ela = mudança de sala).

2.2. «Ele opôs-se a ela» (ela = Maria).

O complemento da frase 1 pode ser constituído por uma preposição seguida de pronome, mas esse pronome é demonstrativo, e não pessoal:

1.3. «Ele opôs-se a isso» (isso = mudança de sala).

Poderemos questionar-nos acerca das razões que conduzem a interpretações sintáticas distintas face a construções similares com um verbo que mantém o seu sentido nas duas construções. Creio que a diferente interpretação se justifica pelas características do próprio complemen...

Pergunta:

Encontra-se referência às formas «auto da fé» e «auto de fé», esta última com maior frequência. Qual a forma que deve usar-se?

Obrigada.

Resposta:

Em português, escreve-se auto de*, ao abrigo do novo acordo ortográfico (AO), ou auto-de-fé, segundo as anteriores normas ortográficas (Acordo Ortográfico de 1945, em Portugal, e Formulário Ortográfico de 1943, no Brasil). A forma auto-da-fé é usada em inglês (cf. Oxford English Dictionary) e em francês (cf. Le Trésor de la Langue Française Informatisée, que também admite a variante gráfica aglutinada autodafé).

Cf. os vocabulários ortográficos mais recentes, que aplicam o AO, a saber, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Porto Editora (disponível na Infopédia), o Vocabulário Ortográfico do Português, no Portal da Língua (ILTEC), e o Vocabulário Ortográfico Atualizado da Língua Portuguesa, da Academia...

Pergunta:

Pretendo saber como deve ser feito o plural de rosa-cruz.

Já me disseram que não forma plural porque é uma ordem ou confraria.

Já me disseram que o plural seria rosas-cruzes (2 nomes, 2 plurais).

Já vi escrito rosa-cruzes.

Por favor, qual é a vossa opinião?

Obrigado.

Resposta:

Não há consenso quanto ao plural de rosa-cruz: as fontes consultadas dividem-se entre rosas-cruzes e rosa-cruzes.

Rebelo Gonçalves, no Vocabulário da Língua Portuguesa (1966), regista como plural do substantivo comum rosa-cruz a forma rosas-cruzes, também consignada no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa e a que figura no Vocabulário Ortográfico do Português do Portal da Língua (ILTEC). No entanto, o Dicionário Houaiss, o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Porto Editora, e o Vocabulário Ortográfico Atualizado da Língua Portuguesa, da Academia das Ciências de Lisboa, todos pluralizam rosa-cruz como rosa-cruzes.

Poderíamos adotar a solução das fontes em maioria, mas acontece que o rigor que se reconhece normalmente ao vocabulário de Rebelo Gonçalves impede a rejeição de rosas-cruzes, pelo que estamos perante uma verdadeiro empate, que nos leva a considerar ambas as formas corretas. Lembremos que, em alternativa ao uso de rosa-cruz como substantivo, existe rosacrucianista e rosa-cruzista, que formam o plural regularmente.

Assinale-se que o Dicionário Houaiss classifica rosa-cruz como substantivo feminino, nas seguintes aceções: «sétimo e último grau ou a quarta ordem do...

Pergunta:

Depois de ler os esclarecimentos prestados pela equipa do Ciberdúvidas em respostas anteriores acerca do plural de apelidos (nacionais ou estrangeiros), continuo com uma dúvida: se optar por fazer o plural de um apelido estrangeiro, devo seguir as regras da língua de origem para realizar esse plural?

Por exemplo, para Lynch, «os Lynches», ou «os Lynchs»? E para Flaherty, «os Flaherties», ou «os Flahertys»?

Muito obrigada pela vossa constante disponibilidade.

Resposta:

Usa-se o plural (cf. The Simpsons), pelo que pluraliza seguindo a regra em inglês: «os Lynches», «os Flaherties».

Dito isto, observe-se que a recente Gramática do Português (Fundação Calouste Gulbenkian, 2013, pág. 1013) considera que a norma não aceita o plural dos apelidos. Permitimo-nos, no entanto, lembrar que o título de um dos mais famosos romances de Eça de Queirós (1845-1900) apresenta um apelido no plural – Os Maias (e não "Os Maia").