Em matéria de língua portuguesa, basta estar atento e o insólito aparece mesmo nas situações mais inesperadas. Surge onde está a linguagem e esta está por todo lado. Um dia destes à mesa dei comigo a ler o contrarrótulo de uma garrafa de azeite Esporão. O texto rezava assim:
«As nossas azeitonas provêm exclusivamente de olivais do Sul de Portugal. São produzidas no nosso lagar, respeitando valores culturais tradicionais. Nasce assim um azeite 100% puro, que preserva todas as características de sabor, aroma e frescura dos frutos.»
O texto é claro e está globalmente bem escrito. Falamos, aliás, de uma empresa agrícola de referência em matéria de vinhos, mas também de azeites, de extremo profissionalismo e que cuida dos mais ínfimos detalhes. E, apesar disso, surge aquele erro de semântica, aquele inadequado «produzidas», atento o contexto! Como se sabe, não são as azeitonas que são «produzidas» no lagar, mas, sim, o azeite... Mantendo rigorosamente a estrutura, o que deveria lá estar era, por exemplo, «transformadas», não «produzidas»… As azeitonas podem ser produzidas numa região, num país, numa herdade. Pode-se falar, por exemplo, da azeitona produzida em Portugal, da azeitona produzida pela herdade x, da azeitona produzida por uma oliveira, pelos olivais alentejanos, pelos olivicultores alentejanos, mas nunca de «azeitonas produzidas no lagar»…