«[…] a fisionomia, o peso; a fisionomia das pessoas também irá contribuir para que o resultado [taxa de alcoolemia] seja diferente de condutor para condutor […]»
Jornal da Tarde, SIC, 7 de janeiro de 2014, 13h55.
Falava-se das alterações ao Código da Estrada, que entraram recentemente em vigor, em Portugal, a mais falada das quais reduz de 0,5 g para 0,2 g o limite máximo permitido de álcool no sangue a motoristas profissionais e condutores encartados há menos de três anos. No estúdio, o jornalista, três motoristas profissionais e um comissário da Divisão de Trânsito da PSP. Os três motoristas sujeitavam-se a uma prova em que bebiam respetivamente vinho, cerveja e whisky. Meia hora depois fazia-se a medição da taxa de alcoolemia.
A dado passo, são referidos os fatores que poderiam influenciar a taxa de alcoolemia, a saber: a quantidade de álcool, o momento do dia em que o mesmo é ingerido, sendo diferente beber uma cerveja ao pequeno-almoço, ao almoço ou ao jantar, o peso e os hábitos alcoólicos. Porém, quando se falou do peso, refere-se – e por duas vezes – a fisionomia. Ora, o que deveria ter sido dito era claramente a fisiologia, que ali se referia aos processos físico-químicos de absorção do álcool pelo organismo que podem variar de pessoa para pessoa, designadamente pela compleição física, e não a fisionomia, ou seja, os traços, as feições do rosto.
Sendo o primeiro elemento (fisio-) comum às duas palavras e variando o segundo (-nomia e -logia), ademais com idêntica terminação (-ia), é provável que a confusão advenha da relação de paronímia entre as duas expressões. A distinção é clara, óbvia, e do conhecimento geral. Porém, etimologicamente, é bastante mais difusa, já que fisio- provém do grego phisio, e engloba aquilo que é relativo à natureza, e -nomia é o elemento de composição que exprime a ideia de lei, de norma, de regra, presente em palavras como agronomia, astronomia, economia, gastronomia, entre outras; por sua vez, -logia é o elemento de composição, também de origem grega, que traduz a ideia de estudo, de tratado, estando muito presente nas designações de ciências e disciplinas como por exemplo a arqueologia, a astrologia, a biologia, a cardiologia, a oftalmologia, a oncologia, a psicologia, entre muitas outras. Literalmente, a fisionomia compreende as «regras» para conhecer a «natureza» humana através do rosto, e a fisiologia «estuda» a «natureza» humana pelo conhecimento das funções do corpo.
P. S. – Ainda no mesmo programa também se refere «estar "sobre" o efeito do álcool» (13h57), o habitual pecadilho de confundir as preposições sobre e sob, já aqui abordado.