Quando se estuda gramática na escola, aprende-se o que é um sintagma nominal: o sintagma nominal é consituído por um nome em torno do qual gravitam vários tipos de constituintes, entre eles o adjectivo.
Em relação àquilo que é designado pelo nome, o adjectivo pode qualificar (ataque terrível) ou classificar (ataque cardíaco).
Mas vale a pena analisar de perto a função ou pertinência de alguns adjectivos em expressões (sintagmas nominais) que foram entrando no ouvido.
Olhe-se bem para a expressão discriminação positiva. Discriminação corresponde à acção de tratar diferentemente um indivíduo ou grupo de indivíduos. Quando o adjectivo positiva aparece, a discriminação estará associada a um acto de favorecimento. Porém, favorecer alguém implica pôr em desvantagem outro alguém. O positivo tem um reverso negativo, necessariamente.
Vejamos neste título: «O papel da sapienza e da honestidade no debate intelectual» (Público, 17/01/08). Pois se debate significa «troca de argumentos», como se pode debater alguma coisa que não seja através do uso do intelecto? Parece que o recurso a este adjectivo previne apenas que se considere debate como uma troca de insultos.
Outro adjectivo muito usado é o adjectivo político(a): já tínhamos ouvido falar em oportunismo político, mas nesta semana ficámos a conhecer a hipocrisia política: Agostinho Branquinho, deputado do PSD, declarou: «Vamos acabar com a hipocrisia política» (Lusa, 21/01/08). O adjectivo político diz respeito a tudo o que envolve a gestão do exercício do poder de governação, mas nestas expressões ele é usado para os governantes se poderem isentar uns aos outros das acções gravosas que cometem.
Mais uma vez verificamos o quanto as explicações da gramática andam longe dos usos reais: constata-se que os adjectivos servem não apenas para qualificar, classificar ou especificar, mas que têm funções muito mais duvidosas.
Artigo publicado no semanário Sol de 26 de Janeiro de 2008, na coluna Ver como Se Diz