Entre todas as disciplinas (do quadro dos estudos secundários) a língua materna foi a que primeiro entrou ao uso do aluno; a que ele começou a adquirir nos primeiros tempos da infância; a que lhe prestou grande serviço antes da escola e o continuará a prestar depois dela.
A língua materna é a palavra interior de que se aproveita a cada instante o processo da nossa vida mental; a exteriorização por excelência, verbal e escrita, de nossas ideias e sentimentos; o meio em que podemos principiar a aprender e interpretar a vida da linguagem.
É o centro de toda a disposição linguística; a expressão de que em regra faz uso a transmissão escolar; enfim, por seus tesouros, o sagrado depósito onde se arquiva a cultura nacional.
«O coração do trabalho educativo e a sua raiz filética, diz Stanley Hall, estão na língua e na literatura vernácula, os dois principais instrumentos do instinto social e do instinto étnico e patriótico.»
«Aviventar no aluno o amor à língua materna, habituá-lo a derivar proveito do que ela vale, da força e beleza que a enaltecem, é um grande dever a cargo do ensino», escreve outro douto pedagogista.
Willst du ein guter Deutscher sein, so sprich deine Sprache rein, aconselha um preceito alemão.
No grau secundário o estudo, embora elementar, desta disciplina, que já vem do primário, tem de propor-se por alvo a aquisição de copiosíssima quantidade de saber e poder, e ainda um efeito formal, além de importantíssimo em si mesmo, obrigatório como antecedente vantajoso de outros estudos congéneres.
Por isso a marcha da respectiva transmissão, a partir dos primeiros estádios, onde entram as noções preliminares, e a terminar nos derradeiros, onde demoram e só podem ser bem compreendidas e apreciadas as maiores riquezas literárias, há-de seguir, sem quebra de continuidade, ininterruptamente pelas diferentes classes, como pede a índole e o valor do assunto, que é um dos eixos de toda a cultura formal, intelectual, estética e moral.
Mostra-se culminantíssima a posição que a língua de cada povo ocupa nos anos, classes ou ciclos dos respectivos institutos de instrução secundária, seja qual for o carácter que os assinale, literário ou científico, humanista ou real.
Hoje corre na escola, como regra vulgar, o preceito estabelecido por Hiecke: que toda a lição deve ser ao mesmo tempo uma lição de língua pátria.
Dos "Estudos de Ensino Secundário", Lisboa, Impr. Nacional, 1919, in "Paladinos da Linguagem, vol. II, Aillaud e Bertrand, Lisboa, 1922.