« (...) À medida que o Cristianismo se disseminou por Roma, chegando ao ponto de assumir o latim como sua língua oficial, o nome grego de Jesus foi latinizado para Iesus Christus (...)»
Já que estamos a exatamente uma semana do Natal, festa máxima da cristandade, gostaria de fazer um comentário sobre o nome do principal personagem dessa comemoração: Jesus Cristo.
Quando eu era criança, achava que Cristo era o sobrenome de Jesus, algo assim como Jesus da Silva ou Jesus Pereira. Mais tarde, aprendi que Cristo é um epíteto dado a Jesus e significa “ungido” em grego. Mas qual era o verdadeiro nome de Jesus? Como judeu que era, ele tinha um nome aramaico (o aramaico, derivado do hebraico, era a língua falada pelos judeus do século I da nossa era): Yehoshua (ou Yeshua) ben Youssef, isto é, Josué, filho de José.
Mas Jesus também era conhecido como Jesus de Nazaré, ou Jesus o Nazareno, em razão de sua cidade de origem. Ao ter sido batizado no rio Jordão e reconhecido como o mensageiro de Javé que viera libertar o povo judeu da opressão romana (Yehoshua significa «Javé salva»), Jesus recebeu o epíteto de Mashiach («Messias»), que em hebraico quer dizer «ungido». Como o Novo Testamento foi redigido num grego tardio chamado koiné, o nome Yeshua Mashiach foi traduzido para Iesoûs ho Khristós, literalmente «Jesus o Ungido».
À medida que o Cristianismo se disseminou por Roma, chegando ao ponto de assumir o latim como sua língua oficial, o nome grego de Jesus foi latinizado para Iesus Christus (o latim não tem artigos), donde o português Jesus Cristo, o espanhol Jesucristo, o inglês Jesus Christ, e assim por diante. Mas, se «ungido» em latim é unctus, por que Jesus não ficou conhecido em Roma como Iesus Unctus? É que o prestígio da língua grega em Roma era muito grande, e o fato [facto] de os Evangelhos terem sido escritos em grego pesou decisivamente para que o epíteto grego Khristós não fosse traduzido, mas apenas adaptado para Christus. Por essa razão, mesmo os cristãos falantes do latim chamavam seu mestre de Christus e não de Unctus, o que, diga-se de passagem, foi ótimo. Já pensaram se a figura central do Cristianismo se chamasse Jesus Unto?
[Na imagem, Adoração dos Pastores, de Gregório Lopes (séc. XVI, 2.º quartel).]
Cf.: Sobrenomes Judaicos (Sefarditas) em Portugal e no Brasil
Texto do linguista brasileiro Aldo Bizzocchi publicado no seu blogue Diário de Um Linguista (18/12/2018).