Segundo o "Correio da Manhã" (“CM”), Humberto Delgado teria ontem feito 100 anos «se não tivesse sido morto pelo regime que apoiou e mais tarde tentou derrubar». Também decerto Assurbanípal haveria de fazer um dia destes 2633 anos se não tivesse sido envenenado… Não sei de que fiáveis informações disporá o “CM” acerca da secular expectativa de vida do general, mas temo que não sejam mais do que as do autor da notícia acerca da volatilidade da língua e do detestável hábito que as palavras têm de pôr-se a falar sozinhas, arrastando divertidamente pelo nariz aqueles incapazes de se fazer respeitar por elas. Os jornais abundam hoje em frases descasadas e em erros de ortografia (dos de sintaxe melhor é nem falar). Os velhos revisores foram-se e as redacções encheram-se de jovens produtos do sistema de ensino. O resultado foi catastrófico. Dêem-me um jornal onde se use hoje uma voz perifrástica ou tão-só um tempo composto e onde o mais-que-perfeito não tenha sido soterrado sob pau para toda a obra do perfeito simples. Curiosamente, é às vezes gente que tem por profissão escrever em português e escreve incompetentemente em português quem mais exige políticos competentes, médicos competentes, magistrados conhecedores e competentes.