Carta da Associação Brasileira de Editoras Universitárias à Comissão de Educação, Cultura e Esportes do Senado Federal brasileiro, a propósito da criação um grupo de trabalho que acolheu as pretensões veiculadas no site Simplificando a Ortografia, que propões uma nova reforma, mais radical e simplificada do que a consagrada na do Acordo de 1990 (adotada oficialmente no país desde 1 de janeiro de 2009, e com plena vigência a partir de a 31 de dezembro de 2015).
Campina Grande, 07/05/14
A ABEU (Associação Brasileira de Editoras Universitárias), em sua reunião anual ocorrida em Campina Grande/PB, entre os dias 07 e 09 deste ano, recebeu com surpresa a notícia1 de que no ano passado a Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado Federal criou o Grupo de Trabalho Técnico (GTT), com a finalidade de rediscutir a “ortografia” de nossa língua, visando a sua simplificação e seu aperfeiçoamento. Isso no contexto presente, em que estamos agora muito pouco distantes da implantação definitiva do Acordo Ortográfico (AO), vigorando no Brasil desde 2009.
Vale lembrar que o AO foi ratificado por todos os países de língua oficial portuguesa e está em avançado processo de implantação em Portugal. Além do que, a partir do AO, pela primeira vez na história de muitos países de língua portuguesa está sendo possível a elaboração de Vocabulários Ortográficos Nacionais. O de Moçambique está (…) pronto; o de Timor [igualmente] e os demais estão em andamento.
O argumento central utilizado pelo GTT em defesa de uma nova mudança ortográfica, de que o projeto pretende «simplificar a língua portuguesa sem gerar prejuízos no processo pedagógico atual», não se sustenta cientificamente, já que as reformas ortográficas alcançam tão-somente o nível da codificação da língua escrita. Hoje é um equívoco fundamental acreditar que a ortografia seria a representação da fala, sendo consensual entre os especialistas que a língua escrita não pode ser interpretada como sendo mero reflexo da língua falada.
Também é preciso observar que, por conta dessa não relação direta entre fala e escrita, a assimilação de uma nova codificação ortográfica é muito mais um reflexo do tempo e da memória experienciada nas relações de leitura e escrita, do que propriamente a assimilação de alguma técnica milagrosa ou facilitadora.
Outro aspecto delicado de um projeto como esse é o impacto econômico que ele causa. Ou seja, seriam exponenciais os custos gerados para readaptar nossos dicionários, o acervo de nossas bibliotecas, a literatura em geral, os nossos livros acadêmicos e didáticos. Sobretudo quando consideramos que grande parte do material impresso no Brasil, a partir de 2008, acabou de se atualizar ortograficamente, segundo o AO vigente, que em grande parte já foi assimilado pela comunidade brasileira de usuários da língua escrita.
Considerando os argumentos acima, a ABEU, em nome de suas quase 120 editoras universitárias associadas, vem registrar a sua rejeição a esse novo projeto de mudança de nossa ortografia, conclamando à Comissão aqui citada para que antes de leva-lo adiante, dê espaço para o contraditório, ouvindo a comunidade científica brasileira especializada – hoje bastante numerosa e qualificada – nos debates sobre os modos de existência das línguas humanas e sobre as especificidades da educação linguística.
1 Agência Senado, Portal de Notícias, 07/03/14
Carta da Associação Brasileira de Editoras Universitárias à Comissão de Educação, Cultura e Esportes do Senado Federal brasileiro, com data de 07/05/2014. Título da responsabilidade do Ciberdúvidas.