Sábado, segunda e terça, nossos jornais noticiaram seqüestros. Voltou a ser moda. Em Caruaru e no Recife. Sendo a liberdade das infaustas vítimas negociada com seus familiares, em troca de grana. Nenhum jornal falou em “rapto”. Estamos melhorando.
“Seqüestro”, não custa lembrar, é privar alguém de sua liberdade, em cárcere privado. Enquanto “Rapto” é sempre de mulher honesta, mediante violência e para fim libidinoso. As meninas de Serrambi não foram “seqüestradas”, pois. Mas podem ter sido “raptadas”. Não obstante esses raptos são cada vez menos freqüentes, perdidos na memória de um passado romântico, de um tempo em que ainda se colocava escadas em janela de namorada. De parte isso, na dúvida, sugere-se aos jovens jornalistas usar sempre “seqüestro”. A chance de errar será estatisticamente pequena.
Um pouco de precisão, nos jornais, não seria mal. “Furto”, por exemplo, é subtrair coisa alheia móvel. “Roubo” é a mesma coisa, só que “mediante grave ameaça ou violência”. Ninguém rouba uma casa, à noite – furta. E pivete na esquina, com gilete ou trinta e oito, não furta – rouba. Prática, aliás, muito em voga nas ruas do Recife. Quando se fala mal de alguém, nos jornais, acaba sendo sempre “calúnia, injúria e difamação”. É muito. E errado. Melhor escolher só um dos três tipos legais – que um pouco de precisão não faz mal a ninguém. “Calúnia”, só para lembrar, é imputar fato definido como crime. “Difamação”, atingir à reputação. E “injúria”, ofender a dignidade do cidadão.
Quando for dar notícia de processo, cuidado. “Despacho” é decisão provisória, dada por juiz ou desembargador, autorizando providências no curso da ação. “Sentença” é decisão final, proferida por juiz. E “Acórdão”, decisão de tribunal. Juiz não expede Acórdão, sentencia. Já “Mandado” é ordem expressa do juiz, para cumprimento de certa determinação – mandado de intimação, mandado de citação. Enquanto “Mandato” é só contrato pelo qual se dá poderes a outro. Ou prazo para exercício de cargo. Na dúvida, use “mandado”. Vai acertar, quase sempre.
Como inglês é língua da moda, da internet, algumas lembranças também são úteis na hora da tradução. “Conspiracy” não é conspiração – é formação de quadrilha. “Immunity Grant” não é imunidade – é acordo com Ministério Público e juiz, pelo qual o sujeito deixa de ser processado, em troca da delação do chefe. “Clear and Present Danger” não é só nome de filme (”Perigo Real e Imediato”, com Harisson Ford), mas, também, teoria da Suprema Corte (1914), no case Shenck x United States, estabelecendo limites à liberdade de expressão.
“Grand Juri” não é “grande júri”. Grand Juri não decide nada. É juízo de admissibilidade. Diz só se alguém deve ser processado. Pode demorar de 12 meses (Grand Juri Estadual) a 18 meses (o Federal). Até mais, em casos específicos. Júri mesmo, como o conhecemos por aqui, é o “Trial Juri”. São diferentes. Até para os jurados. Que, no Grand Juri, vão para casa no fim das sessões (uma a duas, por mês), enquanto, no “Trial Juri”, ficam presos num hotel todo o tempo do julgamento. Faltando lembrar que “Secretary of State” não é Secretário de Estado – é “Ministro das Relações Exteriores”. E “Attorney General”, pelo amor de Deus, não é advogado geral – é “Ministro de Justiça”.
Por fim, conselho de quem é mais velho. Prefira sempre o simples. Diga “Supremo Tribunal Federal”, em vez de “Pretório Excelso”. “Petição inicial”, e não “peça exordial”. “Perito”, e não “expert”. “Mandado de Segurança”, e não “Bill of Mandamus” ou “writ”. “Ministério Público”, e não “Parquet”. “Viúvo”, e não “cônjuge superstite”. Os leitores agradecem.
Publicado no "Jornal do Commercio", do Recife, de 08.10.2004