Estranha-se a frequência com que a forma "jihadista" ocorre nos jornais portugueses, a propósito da atuação do Estado Islâmico nos territórios da Síria e do Iraque. Ora, acontece que no contexto da tradição ortográfica – isto é, dos princípios e critérios decorrentes da reforma de 1911 e mantidos pelos diferentes acordos ortográficos que se têm sucedido até agora* –, é impossível grafar um h entre duas vogais.
Sendo assim, e já como se tem praticado na comunicação social, a palavra em causa deverá ter a forma jiadista, a qual pressupõe jiade como aportuguesamento do árabe jihad (em caracteres arábicos na imagem à esquerda), «dever religioso dos muçulmanos de defender o Islã através de luta [Pode ser cumprido, doutrinariamente falando, de quatro formas: pelo coração, purificando-se espiritualmente na luta contra o diabo; pela língua e pelas mãos, difundindo palavras e comportamentos que defendam o que é bom e corrijam o errado; ou pela espada, praticando a guerra física.]» (Dicionário Houaiss).
* Com a reforma ortográfica de 1911, as palavras que tradicionalmente tinham h medial etimológico perderam-no; exemplos: inhibir – inibir ; exhortar – exortar; sahir – sair; coherente – coerente; ahi – aí; prohibir – proibir. Esta alteração nunca foi posta em causa pelas normas ortográficas subsequentes – nem pelo Acordo Ortográfico de 1945, nem pelo Acordo Ortográfico de 1990. No Brasil, também se generalizou a supressão do h intervocálico, como se pode verificar pelo Formulário Ortográfico de 1943, muito embora neste normativo se abrisse uma exceção para «os topônimos de tradição histórica secular» – é o caso de Bahia.
Falando de extremismos e ainda à volta do acordo ortográfico de 1990 (AO), voltamos a chamar a atenção para a forte contestação gerada no Brasil pela controversa proposta de simplificação radical da reforma ortográfica, desencadeada por setores populistas e de obscura qualificação académica, na qual se advoga, por exemplo, uma discutibilíssima eliminação do h inicial e do hífen ou da substituição do ch pelo x. Os media brasileiros têm feito eco de várias tomadas de posição muito críticas do referido movimento (conhecido como "Acordar Melhor"). É o caso de :
– "Amnésia ou ignorância?", de Evanildo Bechara, filólogo e membro da Academia Brasileira de Letras;
– "Negócios e ideologia juntos contra ortografia", da autoria do jornalista, poeta e escritor brasileiro José Nêumanne, publicado no jornal Estado de São Paulo;
– "Vandalismo ortográfico" de Carlos Alberto Faraco, linguista e consultor dos trabalhos para a elaboração do Vocabulário Ortográfico Comum da Língua Portuguesa;
– "Um erro crasso de ortografia", de Dante Lucchesi, linguista e professor titular de Língua Portuguesa da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Em Portugal, a proposta também não deixou de ser devidamente contextualizada – veja-se "Barbaridades contra a língua portuguesa", da autoria do professor universitário português António Justo, na revista Triplo V. Em registo distinto, pronunciou-se o jornalista e escritor Miguel Sousa Tavares, cometendo, no entanto, várias imprecisões:
– sobre a não ratificação do AO por Angola e Moçambique, ver Acordo Ortográfico: Moçambique prevê ratificar, Angola ainda não + Acordo Ortográfico ainda por ratificar em Angola e Moçambique, 23 anos depois
– acerca da alegada suspensão da entrada do AO no Brasil, ver O Brasil e o Acordo Ortográfico;
– quanto à credibilidade e à (in)viabilidade do movimento "Acordar Melhor", remetemos para os artigos acima indicados e para as declarações do senador Cyro Miranda (que deu projeção política à iniciativa), registadas nas páginas eletrónicas do senado federal brasileiro.
Na presente atualização, as novas questões abordam tópicos relativos à morfologia, à semântica, à sintaxe e à estrutura do léxico. No Pelourinho, José Mário Costa critica mais um caso de pluralização indevida de uma sigla – "os PALOPs", que teima em figurar nos jornais de Portugal em lugar da forma correta, «os PALOP».
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