O primeiro diploma legal português que utilizou a expressão "factoring" foi o Dec.-Lei 46 302, de 27 de Abril de 1965, cujo art. 1.º qualificou como instituições parabancárias, entre outros, as que tivessem «por objecto a efectivação de cobrança de créditos de terceiros (...), designadamente as que exercessem "qualquer sistema da actividade denominada factoring".
O Dec.-Lei 56/86, de 18 de Março, desenvolveu o regime jurídico da actividade em causa, usando, apenas, a palavra "factoring" para a designar.
Tal Dec.-Lei 56/86 foi substituído pelo Dec.-Lei 171/95, de 18 de Julho, que, continuando a usar a palavra "factoring", introduziu a expressão «cessão financeira» como seu equivalente português. A expressão em causa encontra a sua razão de ser em o "factoring" normalmente ter lugar por meio de cessões de créditos.
O Dec.-Lei 171/95 teve na sua base um estudo de António Menezes Cordeiro, intitulado "Da Cessão Financeira (Factoring)" (Lisboa, Lex, 1994). Nesse estudo, Menezes Cordeiro abordou o problema terminológico em causa e apresentou a proposta de introdução na nossa língua da expressão «cessão financeira» para designar o "factoring".
Em 1986, tive ocasião de abordar alguns aspectos do problema. Peço licença para me citar:
«A palavra (entenda-se factoring) é da língua inglesa, com raiz latina (factor). Designando a nossa figura, foi exportada dos Estados Unidos para a Europa no início dos anos sessenta deste século. É recorrente, se não unânime, a filiação do factoring em práticas comerciais da colonização inglesa. No direito e na prática negocial inglesa é tradicional – tradição que se mantém – utilizar a palavra factor para designar certos mandatários comerciais (...). O deslocamento da função nuclear da actividade dos factors do campo comercial para o campo financeiro – deslocamento ao qual surge ligada a palavra factoring – ter-se-ia dado insensivelmente, revelando-se claramente nos Estados Unidos ainda na primeira metade do nosso século. Recordamos que em Portugal e noutros países de língua de origem latina (pelo menos, França, Bélgica e Espanha) já se usaram, e nalguns casos se usam ainda, palavras derivadas da latina factor para designar certos «agentes» comerciais. Assim, no nosso Código Comercial de 1833, o proposto para a gerência de um estabelecimento comercial era o feitor (arts. 100.º e 141.º a 154.º); e, estamos convencidos, não valerá a pena sobrecarregar o peso explicativo da influência do Code de Commerce (cujo art. 634.º define facteur como «celui auquel un commerçant confie le droit de le représenter dans son négoce et d'agir pour son compte»), pois que as Ordenações Filipinas utilizavam feitoria e feitorizar como sinónimos de gerência comercial e de comercializar, respectivamente (cfr. o § 2.º do título III do livro II, onde se determinava que o Ouvidor da Alfândega conhecesse dos litígios entre mercadores relativamente a mercadorias entregues para feitorizar, e o título XXV do livro IV, que, tratando «dos oficiais que não podem ser rendeiros», referia entre as proibições a aceitação de feitorias dos rendeiros). O concurso de influências em Ferreira Borges parece-nos, aliás, documentado no seu Dicionário Jurídico-Comercial – cfr. a entrada «feitor» (2.ª edição, Porto, 1856). Apesar do que fica dito, não nos achamos em condições de propor vocábulos portugueses para designar quer factoring, quer factor (entendendo-se por tal a empresa que tem por objecto o factoring). A possibilidades que não julgamos felizes («contrato de facturação», «contrato de compra de facturação», «contrato de cobrança», ou, ainda, como se tem adoptado ou sugerido no Brasil, «fomento comercial» e «facturização» (...), preferimos a manutenção do uso da palavra inglesa, como de resto sucede na generalidade dos países (até na própria França, onde a lei constrange fortemente o uso público de vocábulos estrangeiros, os substitutivos de factoring – entre os quais parece mais enraízado affacturage, até por ter sido consagrado oficialmente – não conseguiram banir o seu uso)». ("Notas sobre o Contrato de Factoring" in Novas Perspectivas do Direito Comercial, Coimbra, Livraria Almedina)
Por último, mais duas notas. A primeira para sublinhar que, na prática internacional, há formas de "factoring" em que não há lugar a cessão de créditos. A segunda para chamar a atenção para que a cessão de créditos é um mero instrumento; os serviços que o "factor" pode prestar (cobrança, assunção de risco de crédito, financiamento, etc.) não são denotados pela palavra cessão.