Num artigo em forma de carta dirigida ao ministro Álvaro Santos Pereira, Miguel Sousa Tavares reincide no mau uso do verbo realizar. A frase é esta:
que você ainda não realizou bem onde está: num país chamado Portugal»
(Expresso, primeiro caderno, p. 7)
Deveria lá estar obviamente entendeu ou compreendeu, em lugar de "realizou", um «falso amigo» oriundo de uma tradução indevida do verbo inglês to realize, que significa perceber, compreender, entender.
Além do erro, recorrente, estranha-se a sua proveniência. Miguel Sousa Tavares é jornalista e escritor. Ou seja, alguém com obrigações acrescidas no bom uso da língua portuguesa.
P.S. - Apesar do evidente erro de simpatia, que é igualmente comum ao espanhol, o Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, já atesta o verbo «realizar» com o sentido de «perceber, compreender», e o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa também refere para aquele verbo a aceção: «conceber de uma maneira nítida, como real; dar-se conta». Saliente-se, porém, que o facto de os dicionários registarem por vezes formas abastardadas, ortográfica ou semanticamente, como é o caso, não as cauciona necessariamente na perspetiva da norma culta.
Adenda (28 de fevereiro de 2012)
O mau uso do verbo realizar tende, de facto, a tornar-se moda, ainda por cima chancelado por alguns dos nossos melhores. Desta vez foi o jornalista, escritor e gestor cultural António Mega Ferreira que, na Revista do Expresso (25 de fevereiro de 2012), afirma: «Vivemos como se o corpo fosse eterno e de repente realizamos que o corpo não é um dado tão adquirido como sempre imaginamos» (p. 43). É bem certo que se trata de uma transcrição de uma entrevista e que a oralidade permite, por vezes, liberdades que na escrita rejeitamos, mas mesmo assim não se deixa de lamentar o que parece ser uma tendência.