No Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, de António Joaquim de Macedo Soares, 1888, «bunda» é definida como «o assento, as nádegas, palavra chula para os portugueses mas popular no Brasil, e por isso muito aceitável».
Popular e aceitável na oralidade, sim, mas pouco usada na escrita. Só agora, recentemente, a bunda tem vindo a assumir o merecido lugar que lhe compete nos «mídia» e nos trabalhos académicos, com teses de doutoramento e mestrado. Um verdadeiro fenómeno. Fenómeno que foi detectado pelo poeta Affonso Romano de Sant'Anna, que até já escreveu em prosa «os colunistas começaram a escrever a palavra bunda com uma naturalidade tal que de repente vi-me inapelavelmente forçado a encarar o assunto, como ele exige, de trás para a frente». O cronista Arnaldo Jabor também já se pronunciou: «a bunda virou um instrumento de ascensão social. Nossas pobres meninas românticas, pensando em amor e filhos, lutam por um lugar ao sol e são obrigadas a rebolados cada vez mais desbragados (...). A bunda hoje é um capital». O humorista Agamenon esbaldou-se: «temos que valorizar o produto interno e as nossas riquezas naturais. Existe um nicho de mercado na área de bundas, traseiros e nádegas da ordem de biliões de dólares, uma vez que é notória a falta de bundas no mercado mundial. A bunda é uma commodity de alto valer agregado e a bunda tem cotação empinada em Wall Street e na Bolsa de Londres. E não adianta os coreanos tentarem imitar. A bunda brasileira não tem competidoras, ela é criada solta, ciscando no quintal, trepando no muro, trepando na árvore e atrás do cemitério».
Nesta próxima Terça-feira, dia 15, um passo importante será dado com o lançamento de «Bundas – a revista que é a cara do Brasil».
Dirigida por Ziraldo e Jaguar, Bundas vai incluir no seu elenco de colaboradores uma equipa de craques do talento de Millôr Fernandes, Zuenir Ventura, Aldir Blanc, Luís Fernando Veríssimo, Carlos Heitor Cony, Lan, frei Beto e mais uma porrada de «cobras» que, por enquanto, ficam sentados no banco dos reservistas.
São todos herdeiros directos do semanário humorístico Pasquim – de saudosa memória – que nas décadas de 60 e 70 seguraram a barra na luta contra a ditadura militar de plantão. Agora, os tempos são outros, não há o consenso do período militar, quando quase todos estavam contra o regime. Hoje todos são a favor da bunda, que é quase um ex-libris nacional e símbolo emblemático das praias e do carnaval brasileiro.
Crónica publicada no jornal «A Bola»