O jornal Público, no seu questionário Proust tem feito questão de fazer esta pergunta: «Tem noção da época em que os homens homossexuais deixaram de ser chamados “maricas”?”». É só homofobia na formulação ou há motivos ulteriores para publicar um insulto?
As razões editoriais para publicar um insulto racista, por exemplo, devem ser cuidadosamente ponderadas, apesar de ainda infelizmente termos o desprazer de assistir a esse assalto aos valores democráticos, que é o racismo, sobretudo na sobre-excitação do foco mediático em reacção pavloviana à extrema-direita em assinalar qualquer declaração que permita mais clicks.
Esperamos que sobre insultos homofóbicos ou transfóbicos haja a capacidade crítica e a vigilância da parte de jornalistas, para não violentar grupos sociais já estigmatizados na sociedade portuguesa.
No entanto, quando nem o Público abdica de usar esta formulação num questionário de Verão, incluindo quando entrevista pessoas gays e lésbicas, podemos interpretar como um desejo de angariação de um conjunto de leitores homofóbicos a quem esse apodo possa agradar? E mais, e para quem lê e assina habitualmente o Público e se possa sentir ofendido/a pela formulação, o que o Público pode fazer? Ou a liberdade de expressão é também aqui entendida como a piada que a extrema-direita a tornou: o direito inalienável a produzir discurso de ódio sobre grupos socialmente vulneráveis?
[João Manuel de Oliveira, investigador em estudos de género, ISCTE-IUL, in Cartas ao Director, “Público”, 26/07/2023].