Como sabemos, são várias as circunstâncias, isto é, as situações em que ocorre determinado facto, em que se pratica determinada acção. A circunstância é expressa por uma ou mais palavras que completam o sentido de terminada oração. O nome deste complemento relaciona-se com a circunstância. Por isso se chama complemento circunstancial, como vemos na “Nomenclatura Gramatical Portuguesa”, publicada pelo Ministério da Educação Nacional em 1967. Esta nomenclatura menciona apenas os principais. Mas encontrei, há dezenas de anos, um artigo de Augusto Moreno na Revista de Portugal, vol. III, n.º 14, p. 201 e 202.
Esta nomenclatura gramatical continua com vigor. Ainda não foi publicada outra que a substituísse.
Não parece que devamos classificar tal complemento de complemento indirecto. Escrevo que a “Nova Gramática do Português Contemporâneo” é um bom livro, mas convém termos em mente o seguinte:
a) Ela é a gramática brasileira de Celso Cunha com acrescentos de Lindley Cintra.
b) A nomenclatura gramatical brasileira difere nalguns pontos da nomenclatura gramatical portuguesa.
Eis a noção que me parece que devemos ter do que seja complemento (ou objecto) indirecto. Suponhamos a seguinte oração:
O João deu uma bela prenda ao meu filho António.
Temos aqui a acção de dar, na realização da qual entram três seres: João, prenda, António.
Esta acção tem início no João. Ela inicia-se logo que o João se começa a movimentar para pegar na prenda.
A acção de dar transita directamente (sem intermediário) do João para a prenda.
Mas a acção de dar ainda não acabou. Ela continua a realizar-se, quando o João se dirige ao António para lhe entregar a prenda.
Quando o João entrega a prenda, a acção de dar transmite-se ao António mas não directamente – indirectamente, isto é, por meio da prenda.
E assim termina a realização da acção de dar.
Daqui se compreende perfeitamente o seguinte:
a) As designações de complemento directo e de complemento indirecto.
b) O emprego da preposição a a iniciar o complemento indirecto.
Todos sabemos que o complemento indirecto não é regido somente pela preposição a.
Também sabemos que nem sempre que há complemento indirecto há complemento directo, mas geralmente está implícito ou ... como que o sentimos. É o caso de:
O pai bateu ao filho = O pai deu pancada ao filho.
Ele assistiu à reunião = Ele prestou assistência à reunião.
Paguei ao sapateiro = dei dinheiro ao sapateiro. Aqui sentimo-lo.
Não percebo por que motivo na oração “cantava para os amigos” o elemento para os amigos é complemento indirecto.
Como esta oração não está integrada num contexo, não se pode interpretar devidamente. Parece que a situação é a seguinte: aquela acção de cantar ou, talvez melhor, o cântico destinava-se a amigos que estavam a ouvir. Por isso, o cântico destinava-se àquelas pessoas que ali estavam. Se assim for, temos aqui um complemento circunstancial de destinação.
Nunca me constou que, segundo as gramáticas portuguesas da nossa língua, tal complemento se classifique de complemento indirecto.
Bibliografia
Como o assunto em questão é de gramática, aqui vão algumas obras deste assunto. É conveniente o nosso consulente não comprar nenhuma sem primeiramente as observar bem.
José Joaquim Nunes – Gramática Histórica Portuguesa.
Augusto Epiphanio da Silvas Dias – Syntaxe Histórica Portuguesa.
Maria Helena Mira Mateus – Gramática da Língua Portuguesa.
Pilar Vasquez Cuesta e Maria Albertina Mendes da Luz – Gramática Portuguesa.
Eduardo Paiva Raposo – Teoria da Gramática. A Faculdade de Linguagem.
João Andrade Peres e Telmo Móia – Áreas Críticas da Língua Portuguesa.
Vasco Botelho de Amaral – Grande Dicionário de Dificuldades e Subtilezas do Idioma Português.